“Foi então que eles vieram buscar-me e já não havia ninguém para me defender”

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Uso a frase com aspas, apesar de certamente já ter sido adulterada ao longo das décadas, porque tem de ser atribuída a quem de direito. Terá sido proferida, mais ou menos assim, pelo pastor luterano Martin Niemöller, que lutou como pôde contra o regime nazi, instaurado por Hitler, sobretudo através dos seus discursos públicos.

Tenho-me lembrado muitas vezes desta frase ao longo das últimas semanas, por várias razões. Mas a principal é, como não podia deixar de ser, a quantidade exorbitante de informação chocante que nos continua a chegar do outro lado do Atlântico, de um país até há pouco tempo conhecido por ser uma Democracia forte e vigorosa. Pais que são presos quando deixam filhos à porta da escola; funcionários públicos que são arrastados para fora dos gabinetes que ocuparam durante anos porque já não servem; governantes que, quando questionados publicamente, não fazem ideia das mais básicas informações que seriam fundamentais ao correto exercício das suas funções; estudantes que são parados na rua para serem levados aos serviços de imigração...

Sempre fui uma admiradora dos EUA. Acho que não há cidade tão especial como Nova Iorque, que os museus de Washington são lições de História que todos devíamos ter e que a Califórnia tem vinhos (e vinhas) muito interessantes. Mas seria incapaz, atualmente, de pôr um pé em território norte-americano – e digo-lhe, caro leitor, que eu gosto mesmo muito de voltar aos sítios onde fui feliz. E por razões várias, os EUA são um desses lugares, para mim. Mas ir até lá seria não apenas um risco – se os serviços americanos fizerem uma pesquisa nas minhas redes sociais, Donald Trump é capaz de não gostar – como, considero, uma tremenda falta de respeito por todos os que têm sido agredidos física e psicologicamente por um homem que não é mais do que um rufia com demasiado poder. E aos rufias só podemos dar algo: desprezo.

Neste caso em concreto, funciona também não lhe dar o prazer de ter turistas estrangeiros a contribuir para uma economia que, propositadamente, está a deixar em dificuldades com sete meses inenarráveis de ameaças, tarifas, exceções e disparates. Porque uma coisa é certa: ainda não nos terá batido à porta qualquer uma das enormidades que ele tem feito, e às quais dei destaque na minha opinião da semana passada. Mas quando, por azar, for um de nós a ser violentado pelo governo de Trump, é bom que ainda haja quem nos possa defender. Niemöller não estava errado.

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