Fazer a cooperação acontecer 

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No final do mês de maio, a OEI teve a grande alegria de ser a vencedora do Prémio Princesa das Astúrias de Cooperação Internacional, atribuído com esta designação desde 1989. Percorrer os vencedores das últimas décadas é uma travessia pelos protagonistas de uma História recente e o seu contributo para a paz, o diálogo entre diferentes, a luta contra a discriminação, a melhoria das condições de vida, a ciência ao serviço das pessoas e, afinal, a esperança do multilateralismo. Entre os galardoados estão Jacques Delors e Mikhail Gorbachev (1989), Nelson Mandela e Frederik DeKlerk (1992), Yitzhak Rabin e Yasser Arafat (1994), Mário Soares (1995), Fernando Henrique Cardoso (2000), Lula da Silva (2003), Simone Veil (2005), Al Gore (2007), mas também o Alto Comissariado para os Refugiados das Nações Unidas (1991), os Capacetes Azuis estacionados na ex-Jugoslávia (1993), o Programa Erasmus (2004), quatro centros de investigação em África pela luta contra a malária (2008) ou a Iniciativa “Drugs for Negleted Deseases” (2023) que junta institutos de investigação públicos e privados do Brasil, França, Índia, Malásia e Quénia na pesquisa de medicamentos para doenças que afetam os mais pobres e mais vulneráveis.

A OEI recebe esta distinção no ano em que comemora o seu 75.º aniversário. Desde 1949, ano em que foi constituída a Secretaria Ibero-americana de Educação, depois OEI, temos contribuído para melhorar a educação em todos os seus níveis, o que também se estendeu à ciência e à cultura. Em 2010, na XX Cimeira de Chefes de Estado e de Governo, foi aprovado o projeto Metas Educativas 2021, compromisso partilhado por todos os países para alcançar uma educação mais capaz de enfrentar os desafios do século XXI. Na verdade, os objetivos traçados anteciparam aqueles que foram estabelecidos na Agenda 2030 para alcançar uma Educação Inclusiva, de Qualidade e Equitativa, que promova também oportunidades de aprendizagem ao longo da vida.

É consensual a importância da educação para o desenvolvimento e crescimento económico dos países, mas estes conceitos genéricos carecem de ajustamentos constantes às mutações sociais a que vamos assistindo. Entre o que muito tenho aprendido nestes anos de trabalho na OEI, está a constante necessidade de produzir conhecimento sobre os contextos e perspetivas antes de passar à ação. É preciso ir além dos lugares-comuns e das recomendações canónicas, indo buscar os especialistas e promovendo o diálogo entre eles para alcançar propostas que respondam aos desafios de um mundo vertiginoso, convulso e mutante. Além disso, é essencial promover o diálogo entre diferentes visões e objetivos dos governos, promovendo a cooperação internacional como mecanismo de coesão entre países unidos por valores e interesses comuns. 

Uma organização internacional não pode abdicar dos seus valores intrínsecos como a promoção dos direitos humanos, da democracia, da igualdade e da paz, mas tem de buscar pontos de convergência e entendimento. Atualmente, a OEI gere uma média anual de 650 projetos, tendo impactado 12 milhões de pessoas nos últimos 5 anos e contribuído para a formação de 40 mil docentes. Se a grande conquista nas décadas finais do século XX foi a cobertura universal na educação básica, a batalha neste século XXI é pela qualidade, a equidade e a inclusão. Atualmente, a cobertura do Ensino Primário (correspondente ao nosso 1º ciclo) é de 94% em toda a região, mas é de 64% no pré-escolar e de 61% no secundário (que inclui o nosso 3º ciclo). A pandemia foi uma enorme tragédia para a região que viu aumentar os níveis de abandono escolar que estavam a recuar, mas tornou-se também num desafio ao mostrar a importância do digital e até da Inteligência Artificial na Educação.

Portugal participa nas Cimeiras Ibero-americanas desde a sua criação, em 1991, e em 2002 aderiu à Organização de Estados Ibero-americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura, 2002, estabelecendo a sua representação no final de 2017, com os objetivos de aprofundar a cooperação com os restantes países nos domínios da sua ação (desde aí, têm sido várias as iniciativas ibero-americanas realizadas em Portugal, sendo a próxima a reunião da Rede Ibero-americana de Administrações Públicas para a Primeira Infância). O segundo objetivo consistia na aproximação à CPLP, tendo sido a OEI o primeiro organismo internacional a ser admitido como Observador Associado e reciprocamente também reconhecido. Por fim, a presença da língua portuguesa na organização, atualmente um organismo bilingue de referência, estando a Direção-Geral de Multilinguismo sedeada em Lisboa. 

Mas talvez o que mais me desafia, seja o princípio instituído de trabalhar em parceria: estabelecer pontes, construir redes e, assim, conseguir mais e melhores resultados. Mais difícil, mas muito mais saboroso.

Diretora em Portugal da Organização de Estados Ibero-Americanos

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