Falar é fácil, fazer é muito difícil
O título deste texto cita o Senhor Presidente da República, numa afirmação produzida a propósito da reforma do Estado.
É verdade que esta é uma afirmação que se poderia fazer a propósito de quase todas as actividades humanas.
Ganha, no entanto, uma especial acuidade por ter sido proferida por quem foi; por ter ocorrido quando o novo governo incorporou, ex novo, um Ministério da Reforma do Estado e, sobretudo, porque pela primeira vez nas últimas décadas parecem confrontar-se, na sociedade portuguesa, várias e diversas, quando não opostas, concepções de Estado.
Nos termos do artigo 2.º da nossa Constituição, a República Portuguesa define-se como um Estado de direito democrático baseado na soberania popular …
Ora, não haverá de ser o conceito constitucional, apesar da polissemia que lhe é imanente, que o novo ministério vai querer reformar.
Por um lado, porque lhe falece a necessária competência constitucional e, por outro, porque não é crível que o actual governo tenha tal desígnio político.
Governos anteriores ficaram-se, mais modestamente, por pretenderem fazer a reforma da Administração Pública, dando-lhe ferramentas para que a habilitassem a prosseguir melhor o interesse público, sem desnecessárias burocracias, servindo os cidadãos, descentralizando e aproximando as decisões dos seus destinatários.
Afigura-se-me, aliás, que as declarações de Marcelo Rebelo de Sousa, a propósito do novo ministério, foram-no mais do eminente professor de direito constitucional do que do Presidente da República.
Ora, não nos devemos distrair com o discurso da reforma para, do mesmo passo, negligenciarmos a afirmação e a autoridade do Estado.
Socorro-me de algumas noticias, todas constantes da última edição(6 de Junho de 2025) do insuspeito jornal Expresso.
- “Vídeos mostram polícia a “plantar” faca junto ao corpo de Odair”
- “Helicópteros do INEM em risco”
- “Portugal é ponto de entrada de cocaína”
- “80% do areal de Grândola com acesso condicionado às praias”
Tristes exemplos de como a autoridade do Estado é posta em crise, de como alguns dos seus corpos essenciais à afirmação da soberania têm dificuldades em agir e de como a Administração claudica na prestação de serviços essenciais para os cidadãos.
Podemos querer reformar o Estado e podemos e devemos, também, reformar a Administração Pública.
Convém que, pelo caminho,
Naquele engano da alma, ledo e cego,
Que a fortuna não deixa durar muito,
Não abdiquemos, nunca, do exercício da autoridade soberana do Estado e do estrito cumprimento das leis da República.
Advogado e gestor