Escritos de Inglaterra
Kenneth Maxwell, autor de Pombal: Paradoxo do Iluminismo, defendeu a necessidade de publicação dos escritos completos pombalinos, para se compreender melhor e detalhadamente o âmbito e as consequências do consulado de Sebastião José de Carvalho e Melo na história de Portugal, da Europa e do mundo. É por isso importante podermos contar com a publicação pela Imprensa da Universidade de Coimbra da Obra Pombalina, dirigida por José Eduardo Franco, Pedro Calafate e Viriato Soromenho-Marques. Os Escritos de Inglaterra (1738-1739) são o I volume, com coordenação de Ana Leal de Faria. Como se sabe, antes de ser chamado a funções de governo no reinado de D. José o futuro Marquês de Pombal exerceu atividade diplomática como enviado extraordinário de D. João V em Londres (1738-1743) e em Viena (1745-1749). São momentos cruciais para a experiência do futuro governante, nos quais podemos vislumbrar algumas razões para o enigmático paradoxo. Pouco antes de partir para Londres o futuro Marquês recebera a herança de seu tio Paulo Carvalho e Ataíde, arcipreste da Patriarcal, que lhe deixou, entre outros bens, o morgadio em que se integraria a Quinta de Oeiras, de onde proveio fortuna e o título de conde de Oeiras, concedido por D. José em 1759. O futuro governante não tinha diplomas universitários, mas tinha frequentado, por influência do avô, a Academia dos Ilustrados, onde pontuaram os marqueses de Alegrete e de Valença e o 4.º conde da Ericeira, erudito cuja obra foi essencial na tentativa de modernização económica do reino. Este convívio terá por certo pesado na eleição de Sebastião José para membro da Academia Real da História Portuguesa em 1733, servindo de base para uma fulgurante carreira. Sendo certo que não desenvolveu ação académica relevante até ser nomeado para Londres, a verdade é que se destacou pela atenção aos acontecimentos do mundo e pelas qualidades literárias.
Quando Carvalho e Melo chega a Londres, Jorge II, da dinastia de Hanôver, reinava há dez anos, com predominância parlamentar whig, na linha da Gloriosa Revolução de 1688. A Inglaterra tinha a hegemonia marítima e era arbitro na Europa, enquanto D. João V, graças ao ouro brasileiro, praticava uma política de neutralidade, interpretada pelas potências europeias como de cedência aos britânicos, insuficiente, porém, no Estado da Índia perante a ofensiva marata na província do Norte. A Companhia Inglesa das Índias Orientais surpreende Sebastião José pela influência na governação, e Portugal em resultado disso via-se prejudicado, sem que houvesse reciprocidade, como diz a António Guedes Pereira, Secretário de Estado dos Negócios da Marinha e Ultramar. Ao longo destas cartas, onde encontramos o protetor D. Luís da Cunha, sente-se a tomada de consciência da desvantagem portuguesa e da necessidade de uma política mais autónoma, capaz de superar o atraso e de encontrar novos instrumentos de ação. No fundo, era o futuro que se preparava.