Escolas de Fronteira

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Na tarde de 25 de outubro, vivi a alegria de acompanhar a entrega dos Prémios Princesa das Astúrias, que decorreu em Oviedo com a presença dos reis, da Rainha Emérita, da infanta e de sua irmã. Nessa cerimónia, a OEI foi distinguida com o prestigioso prémio de cooperação internacional que assinala os seus 75 anos de atividade ao serviço da educação, da ciência, da cultura, dos direitos humanos. Como forma de destacar esse trabalho, com as pessoas e para as pessoas, foram selecionados três projetos e seus representantes, que receberam a distinção junto com o Secretário-Geral, Mariano Jabonero.

Foi assim que Isabel Guerra, docente do Agrupamento de Escolas Miguel Torga de Bragança, subiu ao palco do Teatro Campoamor, representando 49 escolas, 113 professores e mais de 1500 alunos que integram as Escolas de Fronteira.

Como já avisava o Padre António Vieira, é difícil as palavras expressarem o alcance deste projeto e só vendo se pode assistir à sua capacidade de fazer a diferença através de algo tão simples (e complexo) como estabelecer parcerias entre escolas dos dois lados da fronteira para desenvolver projetos conjuntos envolvendo alunos (na sua maioria, dos 3.º e 4.º anos), professores, encarregados de educação e, mais uma vez, muitas vontades.
O projeto começou pouco antes da pandemia e incluía formação e encontros presenciais entre escolas. Antes, porém, foi necessário envolver responsáveis educativos dos dois lados da fronteira, com modelos administrativos distintos: do lado de Espanha, as Comunidades Autónomas de Extremadura, Andalucia, Castilla y León (a que se veio juntar no ano passado, Galicia); do lado de Portugal, o Ministério da Educação, num modelo mais centralizado, mas com grande autonomia das escolas.

O encerramento das escolas em março de 2020 foi um desafio que se tornou, afinal, decisivo: além da formação virtual, também a construção dos projetos entre escolas seguiu a mesma via. Desde aí, já houve encontros “ao vivo e a cores”, da maior importância para consolidar o trabalho entre parceiros que apenas se conheciam através da “pantalha”. Também sabemos que professores, escolas, encarregados de educação fomentaram outros espaços de diálogo.

Houve dificuldades, desânimos, obstáculos que pareciam intransponíveis, mas os professores e as escolas souberam encontrar o fio de Ariana que trouxe os mais espantosos resultados. Não se trata apenas (ou sobretudo) de uma introdução às línguas de cada lado (que não se resumem ao português e castelhano), mas fomentar uma reflexão conjunta sobre as fronteiras como espaços privilegiados para uma educação intercultural bilingue e plurilingue, os seus benefícios socioculturais, comunicativos, cognitivos e educativos e, sobretudo, desenvolver a capacidade de trabalho colaborativo.

Também na Declaração Conjunta da Cimeira Luso-Espanhola (Faro, 23 de outubro), ambos os países reconheceram “o êxito do Programa de Educação Bilingue e Intercultural ‘Escolas de Fronteira’, em que as 49 escolas participantes se tornaram um motor para o desenvolvimento do tecido socioeconómico das zonas transfronteiriças, combatendo o despovoamento e potenciando comunidades que respeitam e valorizam o património cultural e linguístico luso-espanhol.”

Em Oviedo, a Princesa das Astúrias centrou o seu discurso no poder transformador da esperança e é também ela que move este projeto: a capacidade de construir em conjunto e descobrir o valor do diálogo.

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