¡Es el clima, estúpido!
Há três semanas, escolhi para a minha crónica de domingo no Diário de Notícias o enfático título “É o clima, estúpido!”. A frase de abertura desse texto - o clima entrou em terreno desconhecido - parece ter-se convertido em maldição, pois esta semana a cidade de Valência, na nossa vizinha Espanha, viveu a pior tragédia climática de que tem memória. Este facto não me deixou qualquer margem de manobra, pelo que volto ao tema, agora com título castelhano.
Os fenómenos meteorológicos extremos tornaram-se no novo normal. Bem podem os espanhóis gritar contra a aparente impreparação da sua proteção civil perante as cheias extremas de Valência, aliás como o fazem os portugueses perante os fogos ou os americanos perante os furacões, mas a verdade dura é que ninguém está preparado para isto. O mundo terá certamente de se adaptar, e cada tragédia será uma aprendizagem, mas adianta pouco apontar culpados quando todos somos parte do problema.
Apesar de essencial, a solução não está na adaptação, mas sim na mitigação. É preciso cortar drasticamente nas emissões de gases de efeito de estufa, que são o acelerador impiedoso do aquecimento global e das alterações climáticas.
Os negacionistas continuarão a dizer que o que aconteceu em Valência é apenas um fenómeno meteorológico natural, o qual, por ser comum, até tem uma designação própria, a “Depresión Aislada en Niveles Altos”, conhecida por DANA. Trata-se de uma situação em que uma massa de ar frio se isola nos níveis superiores da atmosfera, separando-se da circulação principal das correntes de ar. O contraste de pressão criado pode gerar tempestades intensas, com chuvas torrenciais e as consequentes inundações.
A má notícia para os negacionistas - e para todos nós - é que, sim, fenómenos como o DANA são naturais, só que as alterações climáticas estão a mudar a estrutura dos sistemas meteorológicos do planeta, criando condições para que tempestades intensas se acumulem sobre uma região, conduzindo a precipitações de uma escala impensável.
Com o aquecimento global, o ar anormalmente quente à superfície dos oceanos faz elevar o ponto de saturação, o que em termos práticos significa que a capacidade de este ar reter vapor de água cresce exponencialmente. Essa quantidade de água gasosa é como uma bomba-relógio que pode ser espoletada por qualquer fenómeno meteorológico trivial. Em Valência choveu em oito horas o que deveria ter chovido num ano inteiro, provocando torrentes de água imparáveis, que arrastaram tudo e todos. No fim do dia, para além dos prejuízos materiais, o número de vítimas mortais chegará a muitas centenas ou mesmo milhares.
A temperatura média do planeta cresceu já 1,3 graus desde a época pré-industrial. E continua a aumentar. Com o relógio em contagem decrescente, continuamos à espera da nova elite de líderes climáticos, não só na política, mas também na economia.