Entidade para a Transparência ou para a Opacidade?

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Quando julgamos que o país avança, as instituições se reforçam, a transparência é maior, o direito à verdade ganha espaço, eis que, de supetão, levamos um murro no estômago.

Senão vejamos!

Até ao ano de 2019, quando foi aprovada a lei 52/2019, os jornalistas que quisessem consultar os rendimentos e o património da classe politica podiam fazê-lo através de um singelo pedido ao Tribunal Constitucional, que, com toda a liberdade e de um modo imediato, dava acesso aos elementos solicitados, sem qualquer restrição.

Eis, então, que no ano de 2019 o complicómetro político ou jurídico foi accionado e foi criada a Entidade para a Transparência (EpT) para gerir o acesso dos jornalistas e de qualquer cidadão ao património e aos rendimentos dos políticos.

Hoje, um jornalista, para consultar o património e os rendimentos da classe política tem de apresentar à EpT um requerimento com uma “fundamentação alargada” sobre o fim a que se destina o referido pedido.

O que era simples e imediato, tornou-se díficil, mais moroso, mais complicado, com escapatórias que podem deixar um pedido congelado, sem resposta, sabemos lá por quanto tempo.

Tudo isto é uma aberração. Os jornalistas são responsáveis pelas informações que recebem e são eles que escolhem e decidem o tratamento que dão a essas mesmas informações, dentro da legalidade e dos parâmetros jurídicos que regem a profissão. Se violarem a lei lá está a Justiça e os Tribunais para os julgarem por eventuais erros cometidos.

Ou seja, com esta iniciativa da aplicação da Lei 52/2019 o país gastou mais dinheiro e a máquina burocrática do Estado cresceu. Foram contratados mais funcionários, foi gasto mais dinheiro dos nossos impostos em novas instalações, a burocracia aumentou. Mas o mais grave é que o país perdeu terreno no que respeita a um elemento essencial da transparência democrática que é o dos cidadãos, através da Comunciação Social, conhecerem, sem restrições, os rendimentos e o património dos políticos.

Escuso-me de vos recordar quem estava no poder em 2019! António Costa, pois claro.

Ou seja, o país tem hoje uma legislação que é mais restritiva e condiciona a liberdade de imprensa. Caminhamos, assim, em sentido contrário ao que se verifica na esmagadora maioria dos países da Europa.

Teria sido apropriado que em vez de termos gasto recursos para criar novos instrumentos jurídicos restritivos da liberdade, tivéssemos, por exemplo, olhado para o exemplo da Noruega.

Trata-se de um país onde existe um total acesso às informações e ao cadastro fiscal de qualquer cidadão, independentemente da posição que ele ocupa na hierarquia da sociedade. Seja rico, remediado, empresário ou trabalhador, politico ou sindicalista, cidadão norueguês ou imigrante, empregada doméstica ou estudante, qualquer indivíduo que viva na Noruega está sujeito ao escrutínio de todos, no que respeita aos impostos que paga e aos rendimentos que aufere.

Ou seja, os assuntos tributários na Noruega são públicos desde a segunda metade do século 19.

Naturalmente, este processo de transparência tem consequências positivas. A primeira e mais importante de todas é que a Noruega é um dos países menos corruptos do mundo. E é, também, o país onde existe uma maior igualdade de salários. Num processo aberto, todos sabem qual o vencimento do colega que se senta na secretária ao lado, pelo que torna-se dificil a existência de grandes disparidades salariais.

Outra consequência é que são bastantes mais baixos os salários dos Executivos das empresas. Comprende-se, facilmente, porquê. O escrutínio do todo social numa fábrica ou num grande supermercado é muito mais rigoroso da parte dos seus trabalhadores, relativamente ao que auferem os quadros superiores das empresas, evitando assim que os salários dos gerentes e afins atinjam níveis astronómicos.

Ainda uma outra consequência é que a Noruega é dos países onde o salário das mulheres se aproxima mais do salário dos homens. Mais uma vez, o resultado do processo de uma total transparência sobre os rendimentos e os impostos que cada norueguês paga.

Tudo, pois, ao contrário do que se pratica por cá. Com a lei 52/2019 a Entidade para a Transparência talvez deva mudar o nome e passar a chamar-se Entidade para a Opacidade.

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