Ensino superior e competitividade
O economista Eric Hanushek, doutor pelo MIT e professor da Universidade de Stanford nos EUA, fez um estudo há cerca de dois anos junto a 80 países e constatou que "a boa formação escolar de uma população explica cerca de 75% do PIB".
Estamos cada vez mais cientes de que o maior capital de que dispomos são as pessoas e delas depende o longo caminho de crescimento e bem-estar que em Portugal ainda temos pela frente. Melhorar as qualificações dos portugueses tem, pois, de estar no centro das políticas públicas, criando condições para um acesso precoce à escola e garantindo que mais e mais jovens podem entrar no ensino superior. Apesar de estarmos quase a atingir meio século de regime democrático - decisivo para deixarmos de ser um país de analfabetos e termos agora a geração mais qualificada da nossa história -, ainda há muitos "velhos do Restelo" que vociferam contra tantos "doutores", argumentando que nem todos necessitam de uma formação superior, e por aí fora. Nada mais errado! Estamos ainda longe da média europeia e, sobretudo, a formação superior já não forma "doutores" - naquele modelo de fato e gravata que ainda permanece nas nossas formas de tratamento, para espanto além-fronteiras -, mas antes representa uma primeira fase de aquisição de conhecimento e competências que terá de prosseguir ao longo da vida.
Está neste momento a decorrer a 3.ª fase de candidaturas ao ensino superior e, até agora, o total de colocados já superou em 16% o ano passado. É uma boa notícia! Sabemos que a pandemia afetou de forma particular os mais novos e fez aumentar o número dos chamados "nem-nem", jovens que nem trabalham, nem estudam, e atingem agora 20% das idades entre os 20 e os 34 anos. Uma riqueza perdida que temos de conseguir conquistar.
Há muito que se refere a falta de produtividade como o maior problema da nossa economia, com efeitos desastrosos na capacidade de criação de riqueza para conseguirmos sair dos ciclos de pobreza que quase achamos endógenos. Não parece haver dúvidas de que temos de reforçar as qualificações para aumentar a produtividade. É nessa lógica - e não em baixos salários - que conseguiremos ser mais competitivos.
A OEI lançou recentemente um relatório sobre a educação superior, produtividade e competitividade na região ibero-americana, que mostra a dificuldade da região em aumentar a sua produtividade. No caso da América Latina, a baixa produtividade não resulta de uma falta de aposta em setores eficientes, mas de um contexto que não tem contribuído para impulsionar esses setores, mantendo-se uma elevada percentagem de trabalho informal (com a pandemia, situa-se nos 54%) e um aumento galopante do desemprego, sendo sobretudo afetados os mais jovens e as mulheres.
Um estudo da Comissão Económica para a América e as Caraíbas (CEPAL) sobre os efeitos da pandemia revela que o PIB retrocedeu uma década e a pobreza aumentou para valores de há 15 anos. Atualmente, há 44 milhões de desempregados (mais 18 milhões do que há pouco mais de um ano).
Como se sublinha no estudo da OEI, a educação superior tornou-se mais decisiva do que em épocas anteriores: em toda a região, existem mais de 4000 instituições de ensino superior e 60% da investigação realiza-se nas universidades. Em 2019, havia 32 milhões de estudantes no ensino superior, número que diminuiu com a pandemia, sendo crucial a criação de estímulos para refrear o abandono, que foi devastador.
Apesar deste cenário negro, as universidades da região ibero-americana estão a responder à grave crise provocada pela pandemia, em muitos casos com incentivos dos governos, através da inovação, do reforço da colaboração com as empresas, por exemplo, criando cátedras conjuntas para a investigação em domínios estratégicos ou através de programas de pós-graduação na indústria, como há muito vinham fazendo os países mais ricos. Outra área essencial é o papel das instituições de ensino superior na formação ao longo da vida, antecipando desde já a transformação acelerada que se prevê nas economias.
Não é, pois, de estranhar o interesse destes países pelos exemplos de Portugal, que em pouco mais de uma geração conseguiu aumentar as qualificações, e, neste momento, aposta em programas de requalificação tendo em conta a profunda alteração do mercado de trabalho que a pandemia acelerou. Um dos maiores desafios é decerto melhorar as qualificações na área de tecnologias de informação e comunicação, inserindo mais profissionais neste setor e criando mais oportunidades de carreira. Esse é um caminho decisivo para aumentar a nossa competitividade. As nossas instituições de ensino superior têm vindo a compreender o papel muito relevante que podem desempenhar neste e noutros domínios para uma formação que terá de ser ao longo de toda a vida.
Diretora em Portugal da Organização de Estados Ibero-Americanos.