Elon Musk é a mais improvável lufada de ar fresco
Nicolás Maduro vê-se rodeado de inimigos. Desde o respeitável septuagenário (mais jovem do que Biden e Trump) com quem disputou a presidência da Venezuela, Edmundo González Urruña, à corajosa líder da oposição, Maria Corina Machado, passando por Washington e por Bruxelas, até aos compatriotas que afugentou do país ou que oprime dentro das fronteiras, bem como à liberdade de expressão, ao direito ao protesto, a votar livremente e a ter os resultados traduzidos em mandatos. E agora o sucessor de Hugo Chávez, menos carismático, mais limitado, mas igualmente capaz de ir perpetuando um regime contrário à vontade do povo e à decência democrática, acrescentou Elon Musk ao extenso rol.
Referindo-se ao “célebre” empresário como seu “novo arqui-inimigo”, Maduro declarou guerra a quem acusa de querer invadir a Venezuela “com os seus foguetões”, para gáudio do séquito de engravatados e fardados que ouviam o discurso do “filho de Bolívar e de Chávez”, enquanto muitos saíam à rua na Venezuela para contestar uma fraude eleitoral descarada ao ponto de compañeros de ruta do regime hesitarem em reconhecer resultados esculpidos e limados nas casas decimais.
É óbvio que Maduro tem motivos para ter ficado desagradado com Musk. Nos últimos dias, o multimilionário tem estado muito ativo no X, rede social que refundou quando comprou o Twitter, empenhando-se em atacar o regime venezuelano e em difundir argumentos da oposição. Chegou a escrever, ao partilhar o vídeo da intervenção do venezuelano sobre a “invasão” dos foguetões da Space X, que chamar burro a Maduro é “um insulto ao mundo animal”. E o tweet em que partilhou a vantagem esmagadora de González sobre Maduro, com base em 80% das atas eleitorais, teve 37 milhões de visualizações.
Maduro alega que Musk encarna o “poder económico apoiando a ideologia fascista da extrema-direita”. E, mesmo não sendo um aspirante a presidente vitalício o melhor barómetro político, é evidente que o dono do X assumiu de que lado está. No que toca à Venezuela, aos Estados Unidos, a Israel e ao wokismo. Não raras vezes intervém como elefante em loja de porcelanas, ao ponto de parecer ter aspirações no Partido Republicano, embora o nascimento na África do Sul lhe impeça o acesso à Casa Branca.
O dono do X é parcial, destravado, não raras vezes demagógico, e tem o mau hábito de ampliar o alcance de fake news, como acaba de suceder com um vídeo de Kamala Harris. Mas tem uma enorme vantagem em relação a outras big tech: assume posições e não se esconde atrás de algoritmos para sonegar informações aos utilizadores. Comparar a sua atuação com a forma como o Google, o Facebook e a anterior gerência do Twitter limitaram ou impediram acesso a conteúdos relevantes, aquando das anteriores Presidenciais norte-americanas, faz de Musk a mais improvável lufada de ar fresco.
Grande repórter do Diário de Notícias