Educação? Chamem os bombeiros

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Portugal vem assistindo, nos últimos tempos, a uma discussão tão inútil, quanto néscia, a propósito da educação dos senhores deputados.

Discussão que resulta, ela própria, da incapacidade de compreensão do fenómeno que lhe está subjacente.

Porventura algum português, no pleno uso das suas faculdades, acredita que deputados de um partido dirigido com mão de ferro, por uma única pessoa, se comportam como o têm feito por iniciativa individual?

Tudo ali tem uma intenção política e institucional óbvia e fácil de perceber. O tentar evidenciar que o Parlamento, os Parlamentos, são antros de vício, povoados por um lúmpen político desqualificado e sem educação, dispensável porque não governam, nem trabalham, antes são moles ululantes e, por isso mesmo, dispensáveis.

Acresce que, porque inúteis e mal-educados, são caros, ainda que pouco se lhes pague.

E os outros partidos “foram à finta” e começaram, tristemente, a responder na mesma moeda…

Ora, o Parlamento, os Parlamentos, são o coração da democracia, porque representam, e só eles o fazem, pelo menos o seguinte:

· a diversidade das sociedades

· a pluralidade de opiniões

· o direito à diferença

· a liberdade de expressão

· o controlo dos demais poderes

· o fórum onde a comunidade se organiza para produzir e aprovar normas que a todos vinculam

· a representação de todos os cidadãos

· o convívio na diferença

· o direito a mudar de opinião espelhado nas maiorias parlamentares diferentes que se sucedem

· o exercício da razão e do livre pensamento.

É tudo isto que a nova internacional de extrema-direita combate e não quer, em Portugal e no mundo.

A 27 de fevereiro de 1933 (fez ontem 92 anos) o Reichstag foi incendiado e, com ele, simbolicamente soçobrou a República de Weimar.

Mas, mais recentemente, quando o vice-líder da extrema-direita mundial conduziu os seus apoiantes contra as instituições, qual é que escolheu? O Capitólio e o que nele funciona, Câmara dos Representantes e Senado.

Alguns ainda se lembrarão de que, quando, em novembro de 1975, se pretendia colocar em causa o processo democrático-constitucional português, o objectivo foi o Parlamento, no caso, a Assembleia Constituinte. Cercado durante vários dias até que o resultado do 25 de Novembro repôs a normalidade institucional possível.

Também o regime que nos oprimiu por meio século, para além de ter feito da Assembleia Nacional a negação do que é um Parlamento, julgou dispensável, mesmo esse simulacro, por quase uma década.

De facto, após o golpe de 28 de Maio de 1926, a Assembleia Nacional só viria a funcionar em janeiro de 1935.

Ainda acham que o que se passa no Parlamento português é um problema de educação?

Para evitar um Reichstag à portuguesa talvez os partidos possam incluir nas suas listas verdadeiros bombeiros. Bombeiros da palavra, da atitude e da respeitabilidade.

Advogado e gestor

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