E um fogo aqui tão próximo…

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A Roménia, país que pertence à União Europeia, à NATO e faz fronteira directa com a Ucrânia - e o que isso significa no panorama geopolítico internacional - vai a Eleições Presidenciais em Maio deste ano. Após a surpresa de um candidato completamente desconhecido, Calin Georgescu, ter vencido a primeira ronda em Novembro passado e de se ter aberto um inquérito sobre a sua campanha, o presidente Klaus Iohannis pediu a demissão. Estando nesse lugar desde 2014 e com saída no final de 2024, a suspeita de interferência exterior nas eleições fizeram-no decidir manter-se até ao novo presidente tomar posse, mas acabou por se demitir, estando o presidente do Senado como presidente interino até as novas eleições.

Afinal, foi provado, com o inquérito, que houve interferência da Rússia num ataque cibernético para apoiar Georgescu, admirador e apoiante de Putin, nas redes sociais - nomeadamente TikTok - nos dias anteriores às votações do final do ano passado. Perante isto, no passado domingo, dia 9, a autoridade eleitoral romena proibiu-o de se candidatar. Deu-se como provadas as “acções híbridas russas agressivas”, os ataques cibernéticos e a promoção maciça de Georgescu na comunicação social no período que antecedeu a votação. Claro que Georgescu nega tudo, bem como a Rússia.

Enquanto parece haver um foco de controlo de outro país nos destinos políticos de uma democracia europeia, o que já de si é muito grave; enquanto a Europa discute o seu reamarmento e percebe que já não pode contar com o apoio dos Estados Unidos na defesa do seu território, caso sofra algum ataque; no momento em que se está a redefinir a geopolítica internacional numa acção contra-relógio, Portugal resolve decidir despir o primeiro-ministro e deitar abaixo o governo, numa atitude irresponsável e completamente despropositada.

Estão a abrir um precedente complicado: levantam suspeição sobre a vida de Luís Montenegro, apesar de não haver qualquer ilegalidade nas suas acções. Esquecem-se, com certeza, de que nenhum deles é um modelo de virtudes irrepreensíveis, que têm todos vida para além da política e que um dia é o da caça, o outro é o do caçador. Pelo que, em vez de pensarem no país e nos problemas, muito sérios, que Portugal terá de enfrentar a curto prazo, alimentam um circo de vaidades e de horrores.

Um fogo aqui tão próximo, em questões da mais variada ordem - democracia em risco, interferência alheia, jogos internacionais a dominarem as linhas nacionais - e os portugueses discutem se o primeiro-ministro deve ou não passar com a toalha de banho entre os gabinetes no Palácio de S. Bento, porque não pode ir dormir para um hotel. Continuem assim. Iremos longe, com certeza, com a toalha à volta da cintura.

Professora auxiliar da Universidade Autónoma de Lisboa e investigadora (do CIDEHUS).

Escreve sem aplicação do novo Acordo Ortográfico

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