E mudar as políticas de segurança?

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A morte de Odair Moniz após ser baleado por um agente da PSP no Bairro da Cova da Moura, na Amadora, fez regressar à agenda mediática/governamental a realidade social e de (in)segurança vivida diariamente por milhares de pessoas, mas que só são notícia quando acontecem situações como esta - seja de cidadãos atingidos pela polícia, seja de polícias atingidos por cidadãos (que também os há).

Na sequência do homicídio de Odair regressaram as análises/críticas à falta de integração na sociedade dos moradores dos bairros mais periféricos - que, já agora, não estão assim tão periféricos -, à ausência de apoio por parte do Estado à sua integração social e à atuação das forças de segurança, com maior foco nos agentes da Polícia de Segurança Pública.

Muitas das dissertações sobre os temas tocam em pontos sensíveis e basta visitar esses bairros para perceber que a vida naquelas zonas não é fácil para os moradores, muitos deles de fracos recursos financeiros e que trabalham longe do local onde habitam, o que os leva a viagens longas para o trabalho e de regresso a casa.

Ao contrário do que algumas pessoas com acesso ao espaço mediático pretendem fazer passar, a grande maioria dos cidadãos que moram em bairros como a Cova da Moura são pessoas de bem, cumpridoras das suas obrigações e que se preocupam com o seu bem-estar e dos filhos, tal como qualquer cidadão que viva num prédio ou num condomínio num qualquer ponto do país.

Foquemo-nos, então, no problema que está identificado há muito: a segurança.

Este é o ponto fulcral para muitos comentadores e analistas que têm surgido nas televisões e rádios a comentar a atitude da polícia e as consequências do tiro mortal.

À parte o esquecimento de uma parte do espetro político de condenar rapidamente os grupos que queimaram caixotes do lixo, que atiraram pedras aos polícias e protagonizaram ataques a autocarros - um deles resultando em ferimentos graves no motorista -, a discussão andou em redor da preparação dos agentes, nomeadamente dos jovens, para lidar com situações complicadas nas chamadas “Zonas Urbanas Sensíveis”.

Já agora recorde-se o que disse sobre esta expressão o superintendente Luís Fiães Fernandes, antigo comandante do Comando Metropolitano de Lisboa, numa entrevista ao DN publicada a 27 de abril passado: “Não é muito feliz.”

Chegamos, desta forma, a uma provável lacuna provocada por decisões políticas ao longo dos anos: a falta de policiamento de proximidade, de polícias visíveis nas ruas.

Atualmente fala-se em videovigilância e bodycams como se fossem a ajuda certa para diminuir a violência nas ruas - e a policial -, mas a verdade é que são apenas formas de prevenção e que, no caso das segundas, ainda não se sabe quando chegam aos equipamentos dos agentes da PSP e militares da GNR.

Voltemos, assim, a um passado não tão longínquo: os policias a patrulhar nas ruas de forma visível e que, pelo menos, servia de dissuasão e de aproximação às populações e os contratos locais de segurança que envolviam autarquias, forças de segurança e associações locais. Esta era uma forma de envolver as comunidades na sua própria segurança.

Quanto ao policiamento de proximidade, o conceito foi tendo avanços e recuos nas últimas décadas, sucumbindo quase sempre com a justificação da escassez de recursos.

Perante os acontecimentos das últimas semanas talvez volte a ser tempo - mais uma vez - de repensar a forma de atuar das polícias e a sua formação. Mas também de reconhecer que há pessoas de bem a viver nesses bairros “sensíveis” e que são muito diferentes daqueles que aproveitam essa malha urbana para criar guetos onde grupos de jovens são iniciados no crime.

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