Dois motores gripados na Europa

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A União Europeia vive dias de desafio para os quais tarda em encontrar soluções. O guerra na Ucrânia, a falta do “guarda-chuva dos Estados Unidos nas questões de defesa, a modernização industrial que tarda, e as escolhas energéticas são alguns dos problemas que o velho continente enfrenta.

A juntar a tudo isto há a realidade das suas duas principais economias, os seus motores de desenvolvimento, a Alemanha e França, que se encontram numa péssima situação financeira. A Alemanha não cresce desde 2019 vivendo uma realidade de estagnação desde o ano anterior, após ter registado 20 anos de crescimento sustentado. Ainda que exista uma réstia de esperança para 2026, onde se prevê que o seu PIB possa atingir 1%, resultante da injecção de 500 mil milhões de euros decidida pelo governo CDU/CSU aliado ao SPD, a realidade alemã é nos dias de hoje preocupante. Em 2024 o valor acrescentado da sua indústria transformadora desceu 3% e a produção industrial registou uma queda de 4,5%. A esta situação há a acrescentar, este ano, um desemprego de 6, 2%.

As tarifas impostas por Trump vieram complicar ainda mais a já frágil economia alemã. A política tarifária do Presidente norte-americano pode ter como consequência a redução do crescimento do PIB alemão em valores entre 0.6% e 1,2%, num cenário muito negativo. A inflação está situada em valores próximos dos 2,4%.

A aposta que a Alemanha fez no hidrogénio verde revelou-se um fracasso. O custo do hidrogénio verde é, actualmente, de 6 euros por kilo, o dobro do produzido por gás natural, prevendo-se que em 2030, um quilo de hidrogénio verde custe 10 euros. Com uma profunda crise no seu sector automóvel o crescimento da Alemanha em 2025 é estimado em apenas 0,3 % segundo a Goldman Sachs, 0,2 % pelos números do Bundesbank e 0% de acordo com o Instituto Kiel.

Por outro lado na França, a segunda economia da zona euro, a situação é, igualmente, de extrema gravidade. Macron tem falhado em toda a linha a solução dos problemas financeiros franceses. Em 2017 o actual presidente francês herdou do socialista François Holland um défice de 3,4% do PIB com a dívida soberana numa trajectória descendente. Dívida que hoje se situa nos 113% do PIB, com um défice de 5,6%, o que prova o que tem sido o fracasso da política financeira de Macron.

Os franceses não são pobres a pedir e querem cada vez mais apoios ao Estado, exigem uma sistemática redução de impostos e recusam mexer na idade das reformas. Esta é uma equação mortal para a macroeconomia francesa. Sem que Macron tenha conseguido uma redução efectiva na conta das despesas do Estado, o orçamento francês distribui-se em 47 % destinados a pensões, saúde e subsídios de desemprego, 34% para despesas do governo e 20% para gastos das autarquias.

Macron tem desenvolvido uma política onde ressalta a baixa dos impostos sobre o capital de 33% para 25%, o que levou a que o classificassem já como o Presidente dos ricos.

A péssima situação financeira vivida na França explica-se, ainda, pelos gastos registados durante o Covid que ascenderam a 170 mil milhões de euros, qualquer coisa como 10% do PIB. Em 2018 a crise provocada pelo movimento dos coletes amarelos veio dar um substancial contributo à situação que a França, actualmente, vive. A baixa de impostos desenhada por Macron e a crise energética europeia explicam a péssima situação financeira da França que, fala-se já, pode estar à beira de um resgate.

Temos assim uma União Europeia que para além de enfrentar as ameaças provenientes de Moscovo e suportar em parte as consequências da guerra da Ucrânia, está sem as melhores condições para fazer frente a este verdadeiro “olho do furacão” financeiro que atinge as duas maiores economias da União Europeia. Talvez reparar ou substituir os velhos motores gripados das economias francesa e alemã, seja, para já, a prioridade inadiável da zona euro.

Jornalista

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