Coragem e carácter
Quando jovens tendemos a, com maior facilidade, ver o mundo a preto e branco. Dividimos o mundo entre amigos e inimigos, entre correligionários, companheiros de jornada e de convicções, e adversários.
Aprendi, jovem adulto, com um companheiro de jornada bastante mais velho que, para além das convicções políticas que feliz e democraticamente nos separam, há duas características essenciais definidoras de qualquer responsável politico: coragem e carácter.
A situação que o país vive exige aos responsáveis políticos, porventura como só o exigiu entre 1974 e 1976, coragem e carácter.
A falta de uma e quebras do outro só nos poderão conduzir a perigosas indefinições e à degradação da democracia.
Numa década, a extrema-direita passou da inexistência a mais de 1.300.000 votos.
Numa década, a esquerda que não governa, passou de 720.000 votos a 300.000.
Numa década, os partidos que governaram Portugal nos últimos 50 anos passaram de 4.380.000 votos para 3.350.000.
Em três anos o PS perdeu um milhão de votos e o PSD(AD) ficou, agora, a quase um milhão de votos dos resultados de 2011.
Cada um fará a leitura que entender mais adequada, olhando para o passado, como os portugueses tanto gostam de fazer. Oscilando entre a auto glorificação e a depressão profunda.
A mim interessa-me o futuro.
Aos futuros líderes políticos exige-se a coragem necessária para salvar a democracia na sua plenitude e impõe-se a dignidade de falar sempre verdade aos portugueses, sem tacticismos estéreis e sem sentido.
E, sobretudo, a coragem de pensarem primeiro no país e só depois neles próprios.
Mas, é essencial cumprir duas outras exigências.
A da humildade e a da credibilidade na proposta política.
A humildade de conhecer as várias realidades de que hoje Portugal é composto.
A humildade de dialogar com todos e a todos prestar atenção.
A humildade de mobilizar as elites, não confundir com aparelhos, sem receios nem “medo da sombra”.
A humildade de serem “um entre iguais” e de fazer, sempre, a pedagogia da democracia.
Mas, também, a exigência da credibilidade da proposta política.
Das propostas que, partindo do conhecimento da realidade da vida das pessoas, lhes dêem esperança no futuro.
Das propostas que, ancoradas no conhecimento do tecido económico, apontem caminhos de modernização e de equilíbrio social.
Das propostas que, percebendo que o nosso sistema eleitoral foi concebido para um território diferente do actual, tenham a coragem de o rever em nome de uma maior participação e representatividade.
Das propostas que pensem, antes de mais, no país e na democracia portuguesa.
Estas não são preocupações para quem teve menos votos, são para todos.
Bem lidos os resultados, poucos terão muitas razões para grandes comemorações.
Salvo se forem tributários do efémero.
Advogado e gestor