“Contrata boas pessoas”: sério?

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É uma frase comum, repetida por gestores, líderes e profissionais de recursos humanos: “Contrata boas pessoas.”

É uma frase postada ad nauseam em todas as redes sociais.

É uma frase de moda e que fica muito bem a quem a posta. Hordas de likes estão assegurados. Outra montanha de prints está igualmente assegurada.

Simples, sonora, aparentemente óbvia. Repito, aparentemente.

Quando vamos mais fundo percebemos a sua superficialidade e a sua inexequibilidade.

Porque não se diz antes “pessoas que tragam soluções?” ou “pessoas que apresentem resultados?”. É evidente que não de qualquer maneira, mas não chega serem boas pessoas.

Mas porque se diz isto sistematicamente?

Porque se trata de um atalho emocional e cultural.

Dizer “boa pessoa” é, muitas vezes, uma forma rápida de comunicar um conjunto de características difíceis de descrever tecnicamente: 1) Alguém confiável; 2) Alguém que não crie conflitos desnecessários; 3) Alguém que respeite os outros; 4) Alguém que trabalhe em equipa e desenvolva o seu trabalho com ética.

Ou seja, é um atalho verbal para traços de caráter e valores que contribuem para um ambiente saudável.

A questão que deixo é como é possível saber, à priori, se alguém é boa pessoa? Não há testes para boas pessoas. Há muito que se possa perguntar, mas a exequibilidade prática desta frase é nula, ou próxima de zero.

Porque se pretende alguém de convivência fácil.

A insistência em “boas pessoas” tem origem num problema comum.

Que é, precisamente, porque contratamos pessoas ótimas para o cargo mas que são um desastre a trabalhar com outros.

O foco passou a ser evitar perfis tóxicos, mesmo que tecnicamente fortes. O trauma organizacional das más contratações tornou, assim, o caráter mais importante que a competência.

A pergunta repete-se: sem dúvida que todos gostarão de trabalhar com boas pessoas (eu gosto), mas e como se faz para saber se alguém é boa pessoa? A boa pessoa efetiva, numa ou várias entrevistas, é igual a uma má pessoa que teatraliza.

Além de que há outro grande risco: Exagerar no critério interpessoal pode fazer com que se negligencie a capacidade real de entrega e “Ser boa pessoa” não paga salários nem sustenta equipas sob pressão.

Dito de outra forma, há muita subjetividade nisto, boas intenções não chegam e haverá certamente outras formas de dizer e fazer que não sejam absolutamente banais e que se estão a tornar cansativas, diria até ridículas, sobretudo para ganhar likes e fazer posts bonitos.

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