Contra os papões votar, votar!
Chegou ao fim uma campanha singular. Singular, por decorrer de eleições convocadas na sequência da demissão de um primeiro-ministro investigado – inédito na democracia que celebra 50 anos neste 25 de abril. Singular, pois segue o embalo das eleições açorianas do mês passado – ganhas pela AD Açores pela primeira vez desde 1992. Singular, porque antecipa uma fervorosíssima campanha das eleições europeias de junho próximo – as únicas que estavam verdadeiramente na mira dos partidos políticos há menos de seis meses. Todavia, algumas conclusões preocupam, sobretudo, no que concerne à dispersão da atenção dos eleitores.
Assim, ressalvo duas ilações. A primeira – amplamente discutida – foi a incapacidade de os partidos esclarecerem os eleitores, como demonstra a percentagem recorde de indecisos, sobretudo, mulheres e jovens, mesmo a poucos dias das eleições. A segunda – mais despercebida – é que parece ter sido descoberto um novo método de deteção de doenças neurológicas, consoante o partido em que se vota. Isto é, quem votar no Partido Socialista, revela uma perda da memória anterógrada e, por conseguinte, é-lhe diagnosticada a doença de alzheimer. Por sua vez, quem votar na Aliança Democrática, manifesta uma perda da memória retrógrada, podendo indiciar a ocorrência de um traumatismo cranioencefálico. Na dúvida, o melhor é mesmo consultar o seu médico ou, então, esquecer de vez o passado e ponderar seriamente o presente e o futuro.
Fantasmas de Natais passados, ao contrário dos fantasmas nas obras de Charles Dickens, pouco, ou nada, acrescentam. Estes, servem apenas de papões de arremesso, como tantos outros. A ladainha vigente de que o crescimento económico se traduz – necessariamente – num aumento das desigualdades, de que a iniciativa privada não é parte de possíveis soluções para o país, de que a imigração traz insegurança ou, inclusive, os próprios dos discursos extremistas, não passa disso. São, meramente, um conjunto de papões. E, contra os papões votar, votar!
Infelizmente, o maior papão – e verídico –, que persiste de eleição para eleição, é a abstenção. A tendência parece estar a melhorar, contudo, mesmo considerando o cenário mais otimista traçado num estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos, em que se sugere que a taxa de abstenção pode ter sido de “apenas” 35% nas eleições legislativas de 2022, este é um cenário que nos deve fazer corar. Cada qual terá as suas motivações, mas recuso-me a aceitar que, num passado não tão longínquo, tantos homens e tantas mulheres deram a vida, literalmente, para que, no fim de contas, ganhe a abstenção e os papões infundados. Recuso-me a aceitar que, num momento histórico para a nossa democracia, abdiquemos do nosso direito de voto – que é também nosso dever.
Abril está aí! Os 50 anos da democracia estão ao virar da esquina, e celebrá-los nunca foi tão fácil e necessário. Cuidemos do nosso bem mais precioso: a liberdade! Enfim, agora e sempre, contra os papões votar, votar!