Como se sente o cuidador informal quando morre a pessoa de quem cuida?
Escrevo hoje em homenagem ao meu tio, que durante dez anos cuidou de forma permanente e extremosa da sua esposa, diagnosticada com a doença de Alzheimer. Foram dez anos de dedicação total, sem um único dia de folga, assumindo com zelo e amor (e também muita exaustão) o seu papel de cuidador informal. Estes dez anos terminaram ontem, com a morte da minha tia.
Esta realidade familiar, que me é tão próxima e que, ao mesmo tempo, me suscita emoções tão diversas, faz-me hoje refletir sobre como se sentem os cuidadores informais quando as pessoas de quem cuidam morrem.
Neste caso, falamos do amor de uma vida e de 60 anos de casamento. Noutros, falamos de filhos que cuidam dos pais, de pais que cuidam dos filhos, e de tantas outras realidades. Pessoas que se dedicam de corpo e alma a cuidar de alguém, de dia e de noite, sem direito a folgas ou a férias, comprometendo ou mesmo abdicando da sua própria vida pessoal, profissional e social. Tantas vezes sentindo que a vida lhes passa ao lado e que as oportunidades perdidas não voltarão jamais.
Os cuidadores informais sofrem diariamente por aqueles e com aqueles de quem cuidam, assistindo, por vezes, a um processo de deterioração progressiva, recordando a pessoa como era e já não é, ou como nunca foi nem nunca será. Sentem-se cansados e esgotados e, em simultâneo, não conseguem sequer conceber a vida sem a presença da pessoa de quem zelam. É um misto de emoções.
Apesar do papel do cuidador informal ter vindo a ser progressivamente reconhecido no nosso país - e, para tal, muito tem contribuído a Associação Nacional de Cuidadores Informais - penso que há vários passos que ainda têm de ser dados. Um deles é o apoio ao cuidador após a perda da pessoa de quem cuidava.
Quando a pessoa que assistia morre, o cuidador sente uma profunda tristeza e angústia, acompanhada de um sentimento de vazio e, não raras vezes, até da perda do sentido de vida. É como se tudo deixasse de fazer sentido. Ao mesmo tempo, pode surgir algum alívio pelo fim do sofrimento da pessoa incapacitada e pelo eventual regresso a uma vida menos exigente, o que, de imediato, gera muita culpa e até vergonha.
É preciso pensar de uma forma séria na necessidade de apoio especializado para todos os cuidadores informais nesta fase da sua vida que, frequentemente, apresentam sintomatologia depressiva e mesmo o desejo de morrerem, como forma de se unirem à pessoa que perderam.
Que esta perda nos ajude a refletir sobre esta realidade.