Celebrar os mortos é celebrar a vida
Com o início do mês de novembro vemos os cemitérios aperaltarem-se de flores, homenagem que por muitos é feita a quem já partiu. Em passo de procissão, as pessoas vagueiam pelas ruas estreitas, ladeadas pelas campas e jazigos, recordando memórias tantas vezes molhadas pelas lágrimas da saudade.
E se muitos dedicam este dia específico para celebrar quem já partiu, tantos outros escolhem outras formas de o fazer. À sua maneira, recusando-se a ficar reféns de um dia marcado no calendário.
Independentemente das crenças de cada um, culturais ou religiosas, a perda de alguém querido reveste-se sempre de muita dor e sofrimento. A tristeza mistura-se com a revolta e com a raiva, surge a culpa, a incompreensão e só algum tempo mais tarde a serenidade da aceitação. Falamos dos processos de luto, necessariamente muito próprios em cada pessoa, e que podem ser facilitados com a expressão emocional, a partilha e a entreajuda.
Mas não apenas de flores nas campas e de lágrimas têm de ser as celebrações de alguém que já morreu. Porque, afinal de contas, celebrar os mortos é não mais do que celebrar a vida e recordar aqueles que já estiveram fisicamente entre nós, e que permanecem, agora, de uma outra forma.
Para os mais novos, a participação nestes rituais acaba também por ter um efeito muito positivo, aprendendo que todas as emoções são válidas e que devem ser expressas sem receios.
Por isso, muitas pessoas escolhem celebrar os entes queridos que já morreram realizando atividades que antes faziam em conjunto. Seja um passeio num dado local que ativa memórias positivas, seja cozinhando a comida favorita de quem já partiu ou ouvindo uma música especial, por exemplo. Acaba por ser uma forma de trazer (ainda mais) para perto a pessoa que morreu. De a honrar e celebrar com a vida, de a sentir através das imagens, dos odores, dos sons ou dos sabores. E, ao mesmo tempo, de valorizar quem está ali ao lado, como que dizendo em surdina "tu importas", "gosto de ti", "quero-te perto".
Para os mais novos, a participação nestes rituais acaba também por ter um efeito muito positivo, aprendendo que todas as emoções são válidas e que devem ser expressas sem receios. Que podem sentir tristeza e saudades, a par de alegria e contentamento por fazerem algo que os aproxima mais ainda de quem já morreu. No fundo, os mais novos aprendem que celebrar os mortos, seja de que forma for, é não mais do que celebrar a vida.
Psicóloga clínica e forense, terapeuta familiar e de casal