Casas precisam-se. Mesmo sem jacarandás no jardim
Nos últimos dias o espaço mediático em Portugal tem estado ocupado por quatro temas: a luta que mais parece de egos no desporto entre o presidente da Federação Portuguesa de Futebol (Pedro Proença) e o responsável pelo Comité Olímpico de Portugal (Fernando Gomes, curiosamente o antigo líder da FPF e que tinha como vice, por inerência devido ao cargo na Liga Portugal, o atual presidente); o futuro dos jacarandás da Avenida 5 de Outubro, em Lisboa; as tricas e intrigas na constituição das listas de candidatos a deputados nas eleições legislativas de maio; e os dados da criminalidade divulgados no Relatório Anual de Segurança Interna.
Quatro temas importantes – na realidade uns mais que outros, mas cada um fará a sua escolha –, mas que conseguiram “tirar” da discussão pública um assunto que afeta milhares de pessoas e do qual praticamente deixámos de ouvir falar: a falta de habitação e os preços das rendas e das casas.
Depois de semanas a debater o tema, as causas para haver tanta dificuldade em arrendar uma habitação e como se poderia “dar a volta” à situação, este tema deixou de ocupar minutos nas televisões.
É certo que há casos positivos. Por exemplo, o presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas, tem agendada uma reunião esta quinta-feira (3 de abril) em Bruxelas com os vice-presidentes executivos da Comissão Europeia, Raffaele Fitto, e Henna Virkkunen. Segundo a agenda disponível, a execução dos Fundos Europeus, em que se inclui o PRR na área da habitação em Lisboa, será um dos temas em discussão.
E em Oeiras vai discutir-se nos dias 10 e 11 a habitação pública no “1.º Congresso Internacional de Habitação Pública”. Isto já depois de, em Cascais, ter decorrido, a 28 de fevereiro, uma conferência sobre o tema denominada “Habitar Cascais”.
No entanto, continuamos a ver e a ouvir alertas de pessoas que não conseguem pagar as rendas pedidas – em Lisboa, o arrendamento de uma casa com tipologia T1 pode custar, no mínimo, mil euros, quando o vencimento médio era, em fevereiro, de 1602 euros brutos –, e a ler notícias sobre ocupações ilegais de casas e terrenos, onde depois são construídas barracas sem condições.
Num país que tem cerca de 700 mil casas devolutas, sendo verdade que muitas não terão qualquer hipótese de recuperação e nas outras os donos não são obrigados a alugar a casa, podem, simplesmente, deixá-la fechada – pois é um direito que têm –, talvez seja a hora de quem decide passar das palavras e discursos para atos.
Como vários especialistas podem explicar, há formas de acelerar essa oferta: dar mais poder às autarquias nas políticas de habitação; avançar com as Cartas Municipais de Habitação,que podem ajudar a uma maior articulação entre as políticas de habitação, ordenamento do território, urbanismo, solos e reabilitação.
Além do investimento público, agilizar a possibilidade de os privados participarem no processo, incluir as IPSS e as misericórdias nestas políticas, e voltar a dinamizar as cooperativas, que no século passado foram uma forma de ajudar muita gente a ter casa.
Juntando ainda projetos como o 1.º Direito e o Construir Portugal talvez se conseguisse “dar a volta” a este problema da habitação, principalmente a dos jovens.
Além de que não é preciso inventar nada, basta até seguir ideias que já existem em Portugal ou olhar para o que fazem os outros países.
Com sorte, até conseguíamos ter bairros onde se colocariam jacarandás nos jardins…
Editor executivo do Diário de Notícias