Bolsonaro e os doidos
A turba bolsonarista reuniu-se no último domingo na Avenida Paulista, emSão Paulo, numa manifestação que tinha como mote pressionar o Supremo Tribunal Federal a absolver Jair Bolsonaro dos crimes de que é acusado, forçar o Congresso Nacional a aprovar uma amnistia ao ex-presidente e ouvir de Tarcísio de Freitas, putativo candidato da extrema-direita à presidência em 2026, a garantia de que, caso eleito, indultará o mentor.
No entanto, segundo o monitor do debate público do meio digital da Universidade de São Paulo, a ONG More in Common e a ferramenta Drive do site Poder360, só 12,4 mil pessoas compareceram à chamada.
Foi, dessa forma, batido o recorde negativo em manifestações do tipo, que pertencia a um ato de abril em Copacabana, no Rio de Janeiro, com 18,3 mil. Em março, na mesma artéria de São Paulo, as mesmas plataformas de contagem registaram 44,9 mil bolsonaristas.
Uma queda regular, mas abrupta, se levarmos em conta que, ainda em fevereiro de 2024, mais de 185 mil se juntavam com a mesma agenda na Paulista.
Os responsáveis pelo protesto elencaram um cardápio variado de motivos para o fiasco nas páginas dos jornais no dia seguinte. Os práticos: as contas do fim do mês, as férias escolares, o jogo no Mundial de Clubes do Flamengo, mesmo sendo uma equipa do Rio de Janeiro e, por isso, com poucos adeptos em São Paulo. E os políticos: o depoimento amedrontado - e, por isso, desmobilizador - de Bolsonaro perante o juiz Alexandre de Moraes transmitido pela TV e, sobretudo, a falta de lealdade de aliados de peso ausentes.
Entre estes, foram citados pela imprensa dirigentes bolsonaristas do partido União Brasil, o mediático e espalhafatoso deputado Nikolas Ferreira, que justificou a ausência por ser padrinho num casamento de uma prima, em Belo Horizonte, e até a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, que alegou estar num evento, mal explicado, do Partido Liberal Mulher, em Roraima.
Eduardo Bolsonaro, terceiro filho do ex-presidente, até publicou um vídeo nas redes sociais a “pedir atenção a quem compareceu e a quem não compareceu” - registe-se que ele próprio, em “autoexílio” nos Estados Unidos há três meses, também não compareceu.
Os poucos anónimos que compareceram, entretanto, estavam, como sempre, em forma: fizeram rezas alucinadas movidas pelos pastores do costume, chamaram o Brasil atual de ditadura, queixaram-se do voto eletrónico e exigiram-no impresso, cantaram o hino do país onde nasceram de mão no coração e venderam T-shirts em homenagem ao país onde gostariam de ter nascido a dizer: “Thank you president Trump.”
Um bolsonarista, em vídeo que viralizou, revelou mesmo que é óbvio que Lula da Silva já morreu e que é um sósia dele quem conduz o país.
Domingo na Paulista ficou provado, portanto, que as possibilidades de Bolsonaro pressionar o Supremo, o Congresso e um eventual futuro presidente aliado a favor dos seus interesses pessoais está cada vez mais reduzida a um núcleo de doidos.