Bolsonarismo é seita

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Dois agentes da Polícia Federal do Brasil (PF) estiveram, em parceria com o FBI, em quatro cidades dos EUA durante duas semanas de maio a entrevistar comerciantes, apreender documentos em joalherias e bancos e recolher imagens de câmeras de segurança.

Segundo o diretor-geral da PF, essas investigações ajudaram a consolidar o caso das jóias oferecidas ao estado brasileiro pelo governo da Arábia Saudita, alegadamente desviadas por Jair Bolsonaro e parceiros no crime.

E o ex-presidente, na qualidade, no mínimo, de implicado no esquema, deve ser formalmente arguido, já em julho.

Só depois devem avançar os processos sobre fraude no cartão de vacinação, que o permitiu fugir para os EUA após a derrota eleitoral de 2022, e o da participação na tentativa de um golpe de estado – em pleno século 21 – no Brasil.

Bolsonaro, que foi acusado de nove crimes na CPI da Covid 19, entre os quais o de emprego irregular de verba pública e falsificação de documentos, esteve ainda envolvido no caso dos pastores evangélicos que enviavam verbas do ministério da Educação, à época sob a tutela de um ministro-pastor, apenas para municípios cujos prefeitos os pagassem em pepitas de ouro.

E estes são apenas alguns dos eventos posteriores ao exercício da presidência da República. Antes, conforme o livro O Negócio do Jair, da jornalista Juliana Dal Piva, o então deputado Bolsonaro usou a política — através da nomeação de funcionários-fantasmas e apropriação de salários deles — para construir um património que lhe permitiu a compra, em dinheiro vivo, de 151 imóveis. O esquema envolveu filhos, a ex-primeira-dama, ex-mulheres, parentes, amigos e milicianos, como Adriano da Nóbrega, fundador do grupo de matadores de aluguer Escritório do Crime.

No entanto, uma sondagem da Paraná Pesquisas de março passado coloca Bolsonaro com 41,7% das intenções de votos, mais 0,1% do que Lula da Silva, em eventual disputa presidencial, caso o capitão não estivesse inelegível por oito anos por abuso de poder político.

Como é possível? Da mesma forma que Donald Trump disse, em janeiro de 2016, em Sioux Center, no Iowa, que poderia matar alguém na Quinta Avenida, em Nova Iorque, e mesmo assim não perder votos, Bolsonaro também pode gritar que é patriota e honesto enquanto enfia joias do estado brasileiro no bolso que os seus apoiantes acreditam.

O assunto extrapola a política e só encontra paralelo nas seitas. Nas plataformas de streaming há uma pilha de exemplos como o dos 39 membros do grupo religioso Heaven’s Gate, liderado por Marshall Applewhite, que cometeram suicídio acreditando que se tornariam extraterrestres. Ou a dos 46 seguidores de Amy Carlson, a alcoólatra que se auto intitulava Mãe Deus e reencarnação de Cleópatra, Jesus Cristo, Joana D’Arc, Marilyn Monroe, Elvis Presley, entre outros, e fundou a Federação Galática da Luz.

Ou como a seita pentecostal da pequena cidade de Knutby, na Suécia, liderada por Asa Waldau, uma autoproclamada Noiva de Cristo que dizia receber mensagens de Deus, pelo telemóvel, como aquela que induziu um integrante do grupo a assassinar outros dois integrantes.

Dizem os psicólogos que os membros das seitas são seres solitários, espiritualmente famintos, em busca do sentimento de pertença. Quando finalmente o encontram, ignoram as evidências mais transparentes, mesmo aquelas que a PF e o FBI parecem ter encontrado nos EUA.     

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