Azeite e Fortuna, às vezes pouca, às vezes nenhuma
E se lhe dissesse que uma Cola Light é considerada mais saudável do que uma garrafa de azeite, acreditaria? Pode parecer mentira – daquelas que se contam no dia 1 de abril - ou uma mera piada de mau gosto, mas é, na verdade, a informação redutora que a anterior Ministra da Agricultura e Alimentação, Maria do Céu Antunes, permitiu que circulasse nos rótulos dos produtos à venda nas superfícies comerciais em Portugal. Mas vamos por partes.
Alguns já terão dificuldade em recordar como era o nosso quotidiano sem a (aparentemente interminável) escalada dos preços dos bens de primeira necessidade – com o caso do azeite a merecer particular destaque.
Assistimos esta semana a mais um capítulo nesta escalada, com o preço daquele que é conhecido como “ouro líquido” a atingir um novo pico: entre o final de 2019 e o início de 2024 o preço do azeite aumentou para mais do dobro. Não obstante, e apesar dos ajustes decorrentes da necessidade de adequar os gastos mensais ao rendimento disponível de cada agregado, os consumidores portugueses parecem relutantes em arredar o pé do consumo deste “ouro”, tendo-se verificado uma redução de apenas 11% no consumo de azeite. Seja pela força do hábito, ou pela preferência em consumir uma gordura considerada mais saudável em detrimento de outras – mesmo que possam ter um custo mais acessível para a carteira, a verdade é que o azeite continua a reunir a preferência dos portugueses. Nos países tradicionalmente importadores – como os Estados Unidos da América - tem se assistido a progressivos ajustes nos cabazes de consumo dos norte-americanos, procurando substituir o azeite por gorduras alternativas mais baratas – mesmo que estas possam ser menos saudáveis. Em sentido inverso, nos países que, à semelhança de Portugal, são grandes produtores de azeite – casos de Espanha, Itália ou Grécia -, verificou-se uma elasticidade igualmente baixa na procura, apesar do aumento continuado dos preços.
Importa, contudo, refletir se o decréscimo da procura a que temos assistido no mercado nacional decorre exclusivamente do aumento dos preços ou se poderão existir outros drivers por detrás desta tendência.
Um facto que terá certamente pesado nas decisões de consumo dos portugueses poderá estar relacionado com o novo sistema de rotulagem
implementado pelo governo liderado por António Costa: o Nutri-Score. Este sistema foi outrora testado por outros países europeus – os quais rapidamente concluíram que este não estava adequadamente calibrado e que os resultados por este fornecidos poderiam, em não raros casos, revelar-se espúrios.
A adopção desta rotulagem revelou ser, desde cedo, um factor penalizador para o sector olivícola - o que acabou por não surpreender ninguém com o mínimo conhecimento ou ligação ao sector agroalimentar. Esta imposição do anterior Ministério da Agricultura e Alimentação surgiu numa fase em que o Governo liderado por António Costa se encontrava em gestão até às eleições do passado dia 10 de março. A introdução pouco avisada desta rotulagem não será certamente alheia ao facto de o Ministério não ter envidado os esforços necessários para procurar um parecer junto da Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária – com a qual mantinha uma relação distante e praticamente inexistente - que aconselhasse (ou não) a sua adopção.
Apesar de ter sido introduzido com o objetivo primordial de permitir simplificar a leitura e ajudar no processo de tomada de decisão por parte dos consumidores, o Nutri-Score, de tão simples, facilmente se tornou falacioso – indicando, no caso do azeite, que este é um produto menos saudável quando comparado, por exemplo, com refrigerantes. Na semana passada o Governo da AD tomou a decisão sensata que se impunha: decretou o fim da rotulagem semáforo por via da Portaria n.º 162/2024/1, de 11 de junho.
O azeite será, possivelmente, o maior caso de sucesso agrícola em Portugal. É autossuficiente no que concerne ao consumo interno e simultaneamente um exemplo de responsabilidade e inovação no que em termos de sustentabilidade diz respeito. Merece, por isso, ser reconhecido, acarinhado e promovido - à semelhança do que os nossos vizinhos têm feito. O azeite deve representar uma pedra basilar da nossa estratégia para a agricultura e para o desenvolvimento económico. Pode ser que assim, mais cedo do que tarde, nos possamos também nós afirmar como referência internacional na produção de azeite, rivalizando, verdadeiramente, com os nossos congéneres do sul da Europa.