As negociações

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As negociações entre a Rússia e a Ucrânia estão a acontecer ocasionalmente, com muitas especulações sobre as propostas e o potencial resultado. Às vezes ouvimos que não está nada de novo em cima da mesa e depois que há alguns sinais sobre a possível solução. Da Rússia chega mesmo a informação de que o lado ucraniano está a pôr em causa as negociações, o que poderá prolongar a guerra.

Ao mesmo tempo, há pedidos de mediação pelos líderes do Médio Oriente, na crença óbvia de que eles têm algumas capacidades especiais para ajudar os dois lados a encontrar a saída da guerra. Às vezes há um convite aos líderes da Rússia e da Ucrânia para se encontrarem cara a cara em Istambul ou Jerusalém e chegarem a um acordo. Em ambos os casos, o presidente da Turquia e o primeiro-ministro de Israel consideram-se bem posicionados, tendo boas relações com os dois lados. O primeiro-ministro israelita Naftali Bennett esteve recentemente em Moscovo e teve um encontro com o líder russo, após o qual falou pelo telefone com o primeiro-ministro da Ucrânia.

As informações vindas de Moscovo são sempre no sentido de apoio às negociações como forma de acabar com a guerra, claro que com a solução baseada na posição russa no conflito. Os ucranianos não estão a dar muita informação à comunicação social, provavelmente sabendo que a vontade declarada de ceder parte do seu território ao país vizinho só pode prejudicar o esforço de guerra e o moral das suas forças.

Em suma, o que se vê na comunicação social dificilmente convencerá alguém de que as negociações estão tornar o fim da guerra mais próximo ou que a solução se está a tornar visível. Mas o esforço dos potenciais mediadores não está a diminuir.
Esta situação está a dar sinais de que toda a história das negociações tem entendimentos muito diferentes por parte de todos os envolvidos. Realisticamente, há alguma razão concreta para acreditar que a solução está à frente de qualquer um? Dificilmente.

Parece que o lado ucraniano tem de negociar, independentemente de acreditar ou não nas conversações, apenas para mostrar que está a fazer tudo o que é possível para parar a guerra. Eles não têm outra opção, a não ser falar com quem quiser falar com eles. A Rússia, por seu lado, não parece ser a parte realmente interessada nas negociações. As suas exigências sobre o território da Ucrânia não serão aceites, eles sabem disso, mas obviamente veem algum benefício em participar nas negociações como alguém que quer parar a guerra. Do mesmo lado, não há medo de que possam perder alguma coisa na mesa das negociações. Também lhes está a dar mais tempo para se reagruparem, abastecerem as suas forças e inventarem um novo plano militar para a próxima semana.

A Turquia e Israel não impuseram sanções à Rússia. Eles têm razões para isso: a Turquia tem uma extensa cooperação militar com Moscovo, procurando algum equilíbrio com as pressões ocidentais sobre a política do seu presidente. As sanções iriam romper tudo o que eles têm estado a construir nos últimos anos. Israel, por sua vez, tem mais de um milhão de cidadãos originários da ex-URSS, ampla cooperação económica e, o que é mais importante, muito bom entendimento na Síria com os russos na luta contra as forças iranianas e os seus aliados. Isso inclui a coordenação entre as forças aéreas israelitas nos ataques ao país vizinho e os militares russos estacionados na Síria, para evitar acontecimentos desnecessários.

Assim, se eles fossem questionados pela NATO, EUA ou UE por não imporem as sanções à Rússia, o papel do mediador é uma explicação perfeita, independentemente de este funcionar ou não. Além disso, os seus líderes agora podem ser vistos como atores importantes no cenário internacional, o que parece muito bem na região, mas também localmente.

As coisas já foram longe demais no campo de batalha. A guerra tem de continuar, porque a Rússia não se pode retirar sem algum "sucesso" militar sério, tendo em mente a posição da sua liderança perante o povo russo. Colocar mais soldados e equipamentos militares no terreno também é problemático, porque resultará em mais baixas civis e militares. Arrastar a guerra pela lama ucraniana é, como se pode ver, a solução atual, esperando que aconteça um milagre em algum dos lados.
Eu pessoalmente nunca acreditei em milagres, mas neste caso, nunca se sabe.

Investigador do ISCTE-IUL e antigo embaixador da Sérvia em Portugal

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