As decisões económicas de hoje definirão a segurança da Europa no futuro
A guerra de tarifas impulsionada por Donald Trump está a pressionar a União Europeia a rever as suas alianças económicas e a acelerar um processo que já era inevitável: a escolha de parceiros comerciais não apenas pela eficiência económica, mas também pela segurança estratégica.
Nos próximos anos, a sua segurança e soberania dependerão menos de tratados diplomáticos e mais de decisões económicas estratégicas. A tradicional divisão entre política comercial e defesa e segurança tornou-se insustentável num mundo onde cadeias de suprimentos são armas geopolíticas. A questão central é clara: com quem a Europa pode e deve fazer negócios?
A dependência europeia da China e da Rússia expôs vulnerabilidades inaceitáveis. A crise do gás russo, catalisada pela invasão da Ucrânia, demonstrou como a UE colocou a sua segurança energética nas mãos de um regime hostil. Ao mesmo tempo, a dependência europeia de componentes chineses em setores críticos, como telecomunicações e semicondutores, levanta preocupações sobre espionagem e interrupções industriais em caso de escalada de tensões com Pequim.
A própria NATO, no seu Conceito Estratégico 2030, reconhece essa realidade. A Rússia deixou de ser um parceiro económico e passou a ser vista como uma ameaça direta e significativa, que deve ser enfrentada com aumento da prontidão militar, fortalecimento da parceria transatlântica e maiores investimentos em Defesa pelos Aliados europeus. Já a China passou a ser um desafio sistémico, exigindo dos Aliados uma política baseada na cooperação e vigilância estratégicas.
Isto inclui reduzir a dependência de cadeias de suprimentos críticas, proteger infraestrutura e propriedade intelectual contra coerção económica, fortalecer a inovação tecnológica para limitar a influência chinesa e reforçar parcerias no Indo-Pacífico para equilibrar o cenário geopolítico. Além disso, exige pressão por maior transparência militar e tecnológica da China e monitorização da sua parceria estratégica com a Rússia, que pode impactar diretamente a segurança euro-atlântica.
Neste contexto, a Europa precisa de uma nova abordagem para equilibrar riscos e interesses.
O modelo tradicional de comércio baseado apenas na eficiência económica já não é sustentável. A ideia de “strategic sourcing” ou “security-shoring” surge como uma solução necessária, onde as relações económicas passam a ser filtradas por um critério de segurança. Não basta à UE diversificar as suas cadeias produtivas; é essencial priorizar parceiros alinhados com os seus valores e interesses estratégicos, reduzindo a vulnerabilidade a regimes hostis.
Os Estados Unidos já aplicam esta lógica, incentivando os seus aliados a reduzirem a exposição à China em tecnologias sensíveis, discurso que não surgiu apenas com Donald Trump, pois Biden já o defendia. A UE deve seguir esse caminho, fortalecendo acordos com democracias industriais, ao mesmo tempo que estimula a reindustrialização interna em setores estratégicos.
Para isso, será necessário enfrentar desafios internos. Muitos países europeus mantêm relações comerciais profundas com Pequim e hesitam em adotar restrições que possam afetar os seus mercados, veja-se as afirmações recentes do primeiro-ministro espanhol.
Mas a escolha é inevitável: a UE não pode continuar a financiar a sua própria vulnerabilidade.
A transição para um modelo de “alliance-driven trade” deve ser uma prioridade. Se a UE quer garantir a sua autonomia estratégica, precisa alinhar a sua política económica à sua segurança coletiva. O tempo das ilusões terminou. A nova ordem mundial exige pragmatismo e decisões corajosas. Porque, no fim, as decisões económicas de hoje definirão a segurança da Europa no futuro!
Especialista em Segurança e Defesa