As batalhas de amanhã serão pela água
Enquanto o país debate se os números do crime aumentaram ou não; se a imigração está desregulada e é útil ou não; se o SNS está ou não a funcionar melhor, como diz o primeiro-ministro um outro ‘crime’ está a ser cometido à vista de todos, constante, inexorável e a conta-gotas.
Atualmente, a cada hora que passa desperdiça-se em Portugal o equivalente a 12 piscinas olímpicas em água potável. Dito de outra forma, as perdas de água anuais em Portugal, cerca de 180 milhões de metros cúbicos, dariam para abastecer o país por três meses. O cálculo é feito por Eduardo Marques, Associação das Empresas Portuguesas para o Setor do Ambiente (AEPSA), numa entrevista à Lusa que deveria ser lida, relida, analisada em todas as salas de aula dos Secundários deste país. “É aquela água que estou a captar, a tratar, a bombar para o reservatório e a mandar para a casa das pessoas e que se perde”, diz.
Não quero, de todo, retirar importância aos temas da segurança, das migrações e da Saúde. São temas que preocupam, e bem, os cidadãos no seu dia-a- -dia e merecem a maior das atenções e o esforço possível para a sua resolução. Mas o tema da água vai ser o campo de batalha dos nossos netos, senão mesmo dos nossos filhos.
Há mais de uma década, o professor Brahma Chellaney – do Center for Policy Research de Nova Deli – escreveu precisamente sobre isso no livroÁgua: O Novo Campo de Batalha da Ásia.
O tema resume-se à seguinte equação: quanto mais desenvolvidas estão as sociedades naquele continente, mais necessários são os desenvolvimentos na sua agricultura para alimentar uma população crescente. Apesar dos enormes rios e bacias de água doce no continente asiático, per As batalhas de amanhã serão pela água capita é o continente com maior escassez de água.
É como diz Chellaney: “As batalhas de antigamente travaram-se por causa de terra. Hoje travam-se pela energia. Mas as batalhas de amanhã serão pela água”.
E o que fazemos nós, Portugal, um país com extensos recursos hídricos, uma orla costeira de 2.500 quilómetros e uma das maiores áreas marítimas do mundo?
Nas concessões públicas de tratamento e entrega de água potável, desperdiçamos mais de um em cada quatro litros (27%) e cobramos pouquíssimo pela água distribuída. O custo baixo da água tem duas consequências: primeiro, não incentiva à poupança, e, segundo, obriga muitas vezes as câmaras a subsidiar para manter a fatura aceitável até às próximas eleições. Estamos literalmente a mandar fora um fator de riqueza no futuro.
No que toca a centrais de dessalinização, existe uma no Porto Santo, uma outra pequena em Albufeira (a operar desde 2009) e só recentemente se adjudicou uma outra maior, a Estação de Dessalinização de Água do Mar do Algarve, também em Albufeira, esta feita com fundos europeus. Portanto, fazemos pouco do lado da poupança e não estamos a pensar a longo prazo para acrescentar fontes alternativas de água.
O programa eleitoral da AD referia a palavra “água” 49 vezes, enquanto o do PS o fazia em 42 ocasiões. Infelizmente, após as eleições de 18 de maio, não vi qualquer uma destas forças a apresentar uma linha sequer sobre o assunto. As prioridades são outras, até ao dia em que não haverá nenhuma outra prioridade.