Apoiar a legítima defesa da Ucrânia é o melhor caminho para a paz
A decisão de Olaf Scholz relativa aos tanques Leopard 2 marca um ponto de viragem na guerra de Vladimir Putin. Foi uma decisão difícil, sobretudo porque os serviços secretos alemães lhe diziam que Moscovo considerava a questão como uma linha vermelha especialmente relevante, que implicaria uma reação significativa. Para reforçar o argumento, Scholz era avisado que o círculo do poder russo enfatizava a possibilidade de utilização do seu vasto armamento nuclear.
Nem as lideranças na Europa nem nos EUA, ninguém quer agravar o conflito com os russos. Isso é particularmente verdade no caso de Scholz, que vê a Rússia como um parceiro fundamental da economia alemã, quer como fonte de recursos energéticos quer ainda como um mercado importante. Mais do que isso, ninguém quer ter uma desavença permanente com um vizinho poderoso. Scholz parece acreditar que mais tarde ou mais cedo haverá um acordo de paz e que será mais fácil chegar a esse ponto se não houver uma escalada das tensões entre todas as partes.
Tem razão em ambos os casos, como todos os que querem que também a Europa seja um exemplo de respeito pelas normas internacionais. Mas isso só poderá acontecer se houver uma mudança radical no Kremlin, que retire do poder Putin e todos os que pensam que é possível fazer renascer, numa cópia mal tirada e absurda, a Rússia imperial ou a influência que a URSS tinha.
Quem tem uma visão clara, sabe que a resolução da crise atual passa por dois marcos: a restauração das fronteiras da Ucrânia, de acordo com a ordem internacional, e o restabelecimento das relações de cooperação com o povo russo. O Ocidente não quer nem derrotar nem humilhar a Rússia. O que está em jogo é punir os criminosos de guerra e ajudar aquele grande país a construir a sua forma de democracia, que tenha em conta a multiplicidade étnica do seu imenso território e as liberdades fundamentais dos cidadãos.
Não podemos ter à frente de grandes potências aventureiros irresponsáveis como Putin e outros do género. Essas são personalidades do passado, nalguns casos criminosos de guerra, déspotas fora de prazo. O mundo de amanhã, interconectado como estará, precisa da cooperação de todos, sobretudo entre os Estados mais fortes. E a cooperação tem de obedecer a regras viradas para o bem comum, para a salvaguarda da vida e da natureza, e respeitadas por todos.
Scholz conseguiu ainda uma outra vitória: levar os americanos a aceitar o envio de tanques altamente sofisticados, do tipo Abrams. É verdade que são máquinas muito complicadas, com exigências logísticas enormes, mas a sua presença no terreno envia um sinal muito forte, que confirma uma vez mais que os EUA estão dispostos a apoiar seriamente a recuperação da soberania ucraniana. O Presidente Biden estava muito reticente, mas acabou por ceder à pressão vinda de Berlim. Scholz mostrou ter uma habilidade diplomática que lhe era desconhecida.
Todo este material tem de chegar à Ucrânia tão rapidamente quanto possível, o que vai exigir um empenho excecional, mas absolutamente necessário. A pressão política sobre os líderes ocidentais deve concentrar-se nessa urgência. Entretanto, é fundamental reforçar os sistemas de defesa antiaérea ucranianos, disponibilizar mais lança-foguetes, grandes quantidades de munições e milhares de peças sobressalentes. Tudo isto pode ser entregue sem demoras.
Qual será a resposta de Putin a todo este novo pacote de ajuda? Para já, e no essencial, vai com uma mão aproveitar a ocasião para continuar a atacar politicamente os norte-americanos e a NATO junto da sua opinião pública, e simultaneamente intensificar os ataques com mísseis contra tudo o que é infraestrutura civil na Ucrânia. E prosseguir na preparação de uma nova grande ofensiva no terreno contra o Leste da Ucrânia, que deverá ter lugar na primavera. Continuará a utilizar Lavrov para tentar ganhar apoios diplomáticos. E bem precisará deles, se pensarmos que até o próprio ministro dos Negócios Estrangeiros do Irão disse, a 19 de janeiro, pasme-se, que o seu país não reconhece a anexação pela Rússia da Península da Crimeia, nem das regiões de Lugansk e de Donetsk. Isto mostra que Putin precisa de pensar muito a sério numa saída da crise que criou.
Conselheiro em segurança internacional.
Ex-secretário-geral-adjunto da ONU