Alberto Franco Nogueira
Passam hoje 30 anos da morte de Alberto Franco Nogueira, diplomata, ministro dos Negócios Estrangeiros de Salazar, preso político do 25 de Abril, professor, historiador e pensador.
Conheci-o bem, entre a sua saída do Governo Marcello Caetano, no Outono de 1969, e a sua morte, em 14 de Março de 1995. Conversei centenas de horas com ele, li os seus livros, estivemos juntos nos exílios, o dele, em Londres, e o meu, no Rio de Janeiro. E muitas vezes viajámos no comboio de Zurique para o Instituto de Estudos Políticos de Bendern, no Liechtenstein, onde encontrávamos amigos e correligionários de uma raça então rara - a nacional-conservadora.
Franco Nogueira nasceu em 17 de Setembro de 1918, em Vila Franca de Xira. O pai era magistrado e as errâncias do serviço iam levá-lo por outras terras de Portugal, na juventude e na adolescência. Era o tempo do brevíssimo consulado de Sidónio Pais, que havia de acabar em Dezembro, com o assassinato do “Presidente-Rei”.
A Esquerda portuguesa não brincava em serviço e tinha os seus instrumentos para silenciar os que verdadeiramente lhe faziam frente. Dez anos antes, para se livrarem de João Franco, tinham liquidado o rei D. Carlos. Sidónio teve a mesma sorte e Salazar, se escapou, não foi porque não tentassem. Hoje prefere-se o assassinato moral, tem menos riscos e não dá cadeia.
A incapacidade, a brutalidade e a violência dos democratas da Primeira República tinham tornado o país ingovernável, justificando o apoio à Ditadura Militar que veio com o 28 de Maio, uma revolução de composição mestiça, à qual Salazar viria a dar a forma e o conteúdo do nacionalismo autoritário, procurando um equilíbrio entre a direita republicana conservadora e os movimentos fascistas da moda europeia.
Franco Nogueira, que conviveu muito com os intelectuais e escritores da Oposição nos anos 40 e primeiros anos 50, entrou para o MNE durante a II Guerra Mundial como encarregado de Negócios na embaixada em Tóquio, logo a seguir à rendição do Japão. Deixou, desse tempo, uma memória literariamente interessantíssima, uma “temperatura” do Japão de então, que lembra os filmes japoneses sobre esse Japão vencido, destroçado, esmagado, nuclearizado.
Na grande remodelação de 1961, quando Salazar decide salvar o Império contra os ventos da História e com apoio da Oposição patriótica, é Franco Nogueira que vai para ministro dos Negócios Estrangeiros, isto é, para a frente de combate nas Nações Unidas e para a relação com os aliados da NATO, que era preciso manter.
Como realistas, Salazar e Franco Nogueira entendiam que, para isso, eram precisas duas coisas: a demonstração de que estávamos para ficar no Ultramar, e que tínhamos capacidade militar e política de o fazer; e a demonstração, também, de que a nossa saída significaria a passagem dos territórios ultramarinos para a esfera soviética. Por isso, e numa perspectiva de Realpolitik, Lisboa ia “favorecendo” os movimentos independentistas mais radicais.
Franco Nogueira dirigiu, na área internacional, esta política, que a História, através dos oficiais descontentes do 25 de Abril, viria pôr em questão. O novo poder militar e os seus inspiradores ideológicos e políticos prenderam-no no 28 de Setembro de 1974. Passou um mau bocado no isolamento, sobretudo quando, depois de um sério problema cardíaco, os profissionais de saúde, em zelo democrático, se recusaram a tratá-lo.
Foi há 30 anos que a morte, misericordiosa, veio poupar Franco Nogueira ao espectáculo deste Portugal à deriva, deste pequeno e marginal rectângulo afogado em pequenas intrigas partidárias.
Politólogo e escritor
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia