Admirável Timor-Leste

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Numa altura em que se debate o retrocesso do número de países no mundo a serem democracias, pela primeira vez em 30 anos menor do que o de autocracias, Timor-Leste destaca-se pela positiva como um dos 88 países que passaram no crivo do Instituto V-Dem, com sede na Universidade de Gotemburgo. No relatório publicado agora pelo instituto sueco, o pequeno país lusófono destaca-se no contexto do Sudeste Asiático, e está no mesmo patamar democrático que países como a Polónia, o Brasil, a Argentina ou Cabo Verde.

Com 23 anos de independência, a contar a partir de 2002, quando terminou a administração pelas Nações Unidas que se seguiu ao referendo que libertou a antiga colónia portuguesa da ocupação pela Indonésia, Timor-Leste serve também para desmentir a ideia que por vezes existe de que as autocracias são mais eficazes do que as democracias, pois há dias foi anunciado um extraordinário êxito do jovem país: a eliminação da malária. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), que constatou que “a cadeia de transmissão autóctone foi interrompida em todo o território nacional, por três anos consecutivos”, tudo resultou de um esforço nacional que vem do primeiro momento pós-independência, apoiado por esforços internacionais. Tedros Ghebreyesus, diretor-geral da OMS, uma das agências das Nações Unidas, destacou, num comunicado publicado no dia 24, “forte vontade política, intervenções inteligentes, investimentos nacionais e externos e profissionais de saúde dedicados”.

Morrem cerca de 600 mil pessoas por ano no mundo vítimas de malária, e grande número de países, nomeadamente na região tropical do planeta, continua sem conseguir eliminar a doença, pelo que é digno de elogio o que os timorenses foram capazes.

Com 15 mil km2 e pouco mais de um milhão de habitantes, Timor-Leste ganhou a admiração internacional pela resistência que opôs aos vizinhos indonésios, invasores em 1975, na fase em que Portugal já se preparava para descolonizar e uma primeira declaração de independência já tinha sido feita. Merece também a nossa admiração por, depois da festa da liberdade, ter-se mantido um país plural, como reconheceu ainda agora o V-Dem. Mas os desafios são muitos, pois os recursos petrolíferos por si só não bastam para assegurar o desenvolvimento, e, além disso, toda uma geração de novos líderes terá de emergir e afirmar-se, pois os históricos Xanana Gusmão, agora primeiro-ministro, e José Ramos-Horta, atual presidente, não serão eternos.

Portugal, pelos laços históricos com mais de cinco séculos, e pelo apoio e solidariedade demonstrados antes e depois do referendo de autodeterminação de 1999, deverá fazer um esforço constante para manter-se ao lado do país lusófono, desde logo a ajudar no ensino da língua que foi escolha dos próprios timorenses para reafirmar a identidade perante os vizinhos Austrália e Indonésia. A distância complica, é certo, mas não é inultrapassável.

Diretor adjunto do Diário de Notícias

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