A última fronteira
A visita do presidente chinês a Vladimir Putin parece marcar um ponto de não retorno da Rússia, ou pelo menos do actual regime russo, em relação à Europa. O afastamento dos russos em relação aos países ocidentais do hemisfério norte, caso seja prolongado, não será apenas político, mas também cultural e civilizacional.
Uma Rússia hostil à Europa, sobretudo depois da invasão da Ucrânia, deverá ser o novo normal por muitos anos, à semelhança do que aconteceu durante a Guerra Fria do século passado. E a Europa terá rapidamente de se adaptar a esta nova circunstância, nomeadamente as instituições da União Europeia. É urgente que decisões importantes sejam tomadas, algumas delas corajosas.
A criação de umas Forças Armadas Europeias é uma dessas decisões que não devem continuar a ser adiadas. A Europa não pode continuar dependente apenas da NATO, o que quer dizer que não pode continuar dependente dos Estados Unidos, ainda que este país deva ser um dos nossos principais aliados. O pilar europeu da NATO tem de ser fortalecido e isso só acontecerá se existir uma força militar europeia relevante.
Os desafios que a Europa enfrenta são grandes e só unida os poderá ultrapassar. E a sua defesa é um desses grandes desafios. É bom não esquecer onde se situa geograficamente o nosso continente. Rússia a Leste, Norte de África a Sul e Médio Oriente a Sudeste. Todas elas regiões com um forte potencial de grande instabilidade política e social. É por isso tão importante que a Europa encontre caminhos de ajuda à estabilização destas três regiões.
É notório que os governos dos Estados da União Europeia nunca tiveram um grande interesse nas suas forças armadas nacionais. Por múltiplas razões os nossos governos têm vindo a desinvestir nesta área e mal termine o conflito na Ucrânia é muito provável que este desinteresse regresse. Umas Forças Armadas Europeias na alçada das instituições europeias garantiriam um investimento militar contínuo e uma maior protecção quando crises como a vivida na Ucrânia surgem, ganhando mecanismos para que possam ser resolvidas ou mesmo evitadas com um maior grau de certeza.
Claro que uma nova instituição militar europeia não é suficiente. É necessária uma diplomacia europeia muito mais forte do que aquela que existe hoje, que não tem qualquer autonomia em relação aos governos nacionais. Não é por acaso que as tomadas de posição da União Europeia sobre problemas internacionais demoram muito mais tempo do que acontece, por exemplo, nos Estados Unidos. E aqui também a existência de uma força militar europeia com relevo daria uma maior credibilidade à diplomacia europeia. É urgente que a Europa fale a uma só voz nas questões internacionais e que seja célere nas respostas quando surgem crises.
A criação de Forças Armadas Europeias talvez não seja uma decisão que agrade as opiniões públicas da própria Europa. Mas é tempo de termos políticos corajosos, com visão, que vejam além das suas fronteiras nacionais. É que, no caso português, a nossa fronteira não acaba em Valença, Vilar Formoso, Elvas ou Vila Real de Santo António. Quer queiramos ou não a nossa fronteira, a Leste, começa no Norte da Finlândia e vai até às ilhas da Grécia e à ilha de Chipre a Sul. E a nossa segurança começa precisamente nessa última fronteira.
Presidente do movimento Partido Democrata Europeu
(O autor escreve de acordo com a antiga ortografia)