A recondução de Centeno

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A eventual recondução do governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, tem merecido comentários por parte dos líderes dos maiores bancos nacionais. Na quinta-feira, foi a vez de João Pedro Oliveira e Costa, CEO do BPI, defender a recondução de Centeno para um segundo mandato, na conferência de imprensa de apresentação dos resultados anuais do banco. Descrevendo o governador como “independente”, o CEO do BPI defendeu que Centeno tem prestígio internacional e que a “sua continuidade seria algo positivo”. Para logo acrescentar, de forma salomónica: “Se não for o professor Mário Centeno, cá estaremos para o receber. Se for, continuaremos no bom caminho.”

Sem querer colocar em causa a sinceridade destas declarações, estranho seria se os banqueiros dissessem outra coisa sobre o regulador do seu setor. Mas é inegável que Mário Centeno tem demonstrado independência no exercício da função, sobretudo nos últimos tempos, com os avisos sobre as perspetivas para a economia e a recusa em pagar o salário de Hélder Rosalino, se este transitasse para o Governo. Neste contexto de aparente mal-estar entre o Executivo e o governador, não falta quem aposte que Centeno não será reconduzido para um segundo mandato, apesar de o ministro das Finanças, Miranda Sarmento, ter garantido recentemente que a decisão ainda não está tomada.

No entanto, a origem deste mal-estar não é recente e explica-se também com o percurso político do atual governador. É bom recordar que Mário Centeno foi nomeado para liderar o Banco de Portugal após ter sido ministro das Finanças de António Costa. E que, durante a crise política que ocorreu no final de 2023, este último o sugeriu ao Presidente da República como potencial sucessor, em alternativa à realização de Eleições Legislativas antecipadas. O governador e ex-ministro das Finanças é, além disso, a personalidade da esquerda que está melhor colocada para se candidatar à Presidência da República - apesar de já ter dito que não o pretende fazer -, tal como demonstra a sondagem ontem divulgada pela SIC, que lhe atribui 17% das intenções de voto (contra os 25% do almirante Gouveia e Melo, que continua à frente nos estudos de opinião sobre as Presidenciais).

Face ao exposto, a forma como o Governo de Luís Montenegro gerir este dossier vai ser decisiva para a credibilidade da independência do governador do Banco de Portugal. Tanto a recondução, como a escolha de outra personalidade para assumir a função comportam riscos e não será uma decisão fácil. O certo é que o país ficará a ganhar se o governador do Banco de Portugal for uma personalidade de reconhecido mérito, respeitada por todos os quadrantes políticos e que desempenhe a sua função com independência face ao poder político.

Neste sentido, a recondução de Centeno poderá não fazer sentido em termos de jogo político, mas seria, paradoxalmente, uma prova de força e de confiança por parte de um Governo que se apresenta como reformista e defensor da meritocracia.

Diretor do Diário de Notícias

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