A primazia do Serviço Nacional de Saúde

O Serviço Nacional de Saúde (SNS) é, a par da rede escolar pública, o principal fator de coesão económica, social e territorial do nosso país. Está ao dispor de todos os portugueses, onde e quando dele precisam, quer na prestação de cuidados de saúde quer na comparticipação de medicamentos e exames complementares de diagnóstico e tratamento.

O SNS é universal, geral e tendencialmente gratuito, um dos motivos pelos quais tem enormes vantagens competitivas sobre os operadores privados da saúde. Mas há outras características únicas: a enorme rede de infraestruturas, a completa oferta de cuidados, a excelente qualidade dos profissionais, nomeadamente dos médicos, e a exclusividade da capacidade formativa.

A quantidade, distribuição e diversidade das instalações e dos equipamentos do SNS abrangem todos os distritos, concelhos e a maioria das freguesias do continente e regiões autónomas, enquanto as infraestruturas privadas se distribuem, quase totalmente, pela orla marítima.

A cobertura assistencial é também global e inclui cuidados de saúde primários, que incorporam unidades de saúde pública, cuidados de saúde hospitalares, gerais ou especializados, com organizações e ofertas variadas e cuidados continuados integrados que compreendem unidades de convalescença, de cuidados paliativos e de cuidados domiciliários. A oferta privada de saúde em Portugal só muito pontualmente pode garantir toda a gama de valências do setor público.

O SNS é servido por profissionais de elevadíssima competência e em quantidade globalmente adequada. A diversidade, a diferenciação e a dedicação específica dos médicos do SNS, em todas as suas áreas e valências, é única e inigualável. Com a certeza, porém, de que, numa estrutura com esta enorme dimensão, é, e será sempre, natural que haja falhas pontuais, as quais, sendo incómodas ou penosas para os cidadãos, não ferem a sua operacionalidade sistémica, como um todo. É o que acontece, sobretudo, na mais exigente, e infelizmente menos reconhecida, área dos cuidados de saúde primários - a montra do SNS.

Salvo raríssimas e honrosas exceções, a generalidade das várias e sucessivas gerações de médicos portugueses obteve a sua formação especializada trabalhando e aprendendo, como internos, nas diferentes estruturas do SNS. Os internatos de especialidade dos médicos e as suas carreiras profissionais foram conquistas fundamentais para os próprios e para o bom funcionamento e eficiência dos serviços de saúde públicos e privados. Também a maioria dos enfermeiros, fisioterapeutas e técnicos de diagnóstico deve a sua formação pós-graduada ao SNS. Foi ainda aí que todos estes profissionais de saúde adquiriram, e continuam a obter, a sua educação prática específica, pré-graduada.

Este é todo um insuperável acervo organizacional que todos os portugueses devem conhecer e não podem esquecer.

Quer isto dizer que os operadores de saúde privados não estão a trabalhar bem ou a fazer o que lhes compete? Não. Os grupos hospitalares privados fazem o que lhes pertence, de forma profissional e eficiente. O seu crescimento nos últimos anos tem sido notável e o grau de confiança dos cidadãos nas suas prestações é, em geral, bastante satisfatório.

Mas o SNS é, e tem de ser, a sede à qual todos nós, sem exceção, devemos poder recorrer, se dele necessitarmos. E este é o património verdadeiramente singular do SNS: os seus doentes, ou seja, todos nós, sobretudo aqueles que os serviços de saúde privados não podem e/ou não devem cuidar.

Diretor do Serviço de Reumatologia no Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, EPE - Hospital de Egas Moniz; professor catedrático da Nova Medical School - Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa

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