A manifestação de interesse não deve voltar: sete razões

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Muito se tem falado sobre o fim da “manifestação de interesse”, decidido pelo governo em junho. Reações sucedem-se, pedindo o regresso deste mecanismo, que estava em vigor desde 2017 e era único na Europa. Tratava-se de um direito permanente à regularização de todos os que tivessem entrado em Portugal, legal ou clandestinamente (neste caso, ao fim de um ano), e tivessem contrato de trabalho ou promessa de contrato de trabalho. A inscrição na Segurança Social era dispensada neste último caso.

Esta passou a constituir a principal via de entrada no país para a chamada “imigração económica”: era mais fácil entrar clandestinamente ou dizer que se vinha em turismo do que tratar de um visto de trabalho antecipadamente. Este efeito levou a um verdadeiro dominó de resultados perniciosos, que é preciso recordar. Assim, são pelo menos sete as razões que devem manter o governo firme na decisão de não voltar atrás:

1. Regularizações permanentes provocam um “efeito-chamada” de imigração ilegal: sabe-se que Portugal regulariza, e isso é uma fonte atrativa de negócio para as redes criminosas;

2. Durante um ano, os migrantes que entraram clandestinamente sujeitam-se a tudo, sendo presas fáceis de exploração no trabalho ou na habitação - são seres sem voz nem direitos, vivendo no permanente pânico da denúncia;

3. Desenvolvem-se esquemas paralelos de abuso do sistema, como “vendas” de falsas promessas de contrato de trabalho ou outros;

4. O Estado não consegue controlar nem quem nem quantas pessoas estão no país a trabalhar, nem tão-pouco saber em que condições vivem;

5. O enorme volume de processos e de pedidos levou ao verdadeiro “afundamento” do SEF, e depois da AIMA, ficando em atraso também os pedidos referentes a direitos fundamentais, como o reagrupamento familiar ou até mesmo o asilo;

6. Desenvolveram-se novos “esquemas paralelos”, em que coisas como a simples marcação de vaga para atendimento na AIMA passou também a ser objeto de tráfico;

7. Portugal corre o risco de funcionar como “porta de entrada” da imigração ilegal para a Europa, sendo o ponto fraco de uma política comum de imigração, que desde 2008 tem sido contra regularizações permanentes e em massa.

É preciso o governo manter-se firme na decisão de terminar com aquela solução e procurar a entrada de imigrantes no nosso território (que todos reconhecemos ser absolutamente necessária) por outras vias. Uma solução que assenta em embustes ou clandestinidade de partida não pode ser a via normal de imigração para um Estado de direito. Uma solução que desumaniza quem chega não pode ser a correta. E muito utilitaristas seremos se aceitarmos conviver com situações de degradação humana só porque a economia e demografia do país precisam de mais pessoas.

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