A labilidade emocional do Brasil
Os psicólogos e os psiquiatras definem o fenómeno de passar rápida, intensa e, muitas vezes, desproporcionalmente da euforia à depressão, e vice-versa, como labilidade emocional.
Quando essas oscilações são muito frequentes, podem estar associadas a quadros como transtorno de personalidade borderline, em que a instabilidade emocional é uma característica central; transtorno bipolar, especialmente na ciclagem rápida, embora, no paciente bipolar, as fases de euforia e depressão costumem durar dias, semanas ou mais; transtornos de ansiedade ou de stress pós-traumático; ou alterações neurológicas.
Se essas mudanças forem muito frequentes ou afetarem significativamente a qualidade de vida, vale a pena procurar um profissional de saúde mental para avaliação. Se, porém, ocorrem ocasionalmente, podem ter aquilo a que os manuais chamam de “gatilho”: fadiga, privação de sono, muito stress, uso de álcool ou estimulantes.
O Brasil em geral - não apenas um brasileiro individualmente - passa rápida, intensa e, muitas vezes, desproporcionalmente da euforia à depressão, e vice-versa, por culpa de um “gatilho”: o futebol.
No Mundial de Clubes dos EUA, antes de começar a prova, segundo o nosso paciente, o futebol do autodenominado “país do futebol” estava acabado, atrasado, desfasado, falido, esgotado, exaurido, minguado e a léguas do futebol europeu, tão milionário, tão bem-sucedido, tão viçoso, tão esplêndido, tão invejado, tão inalcançável.
Três ou quatro bons resultados e atuações depois de Palmeiras, Botafogo, Flamengo e Fluminense frente a clubes europeus depois, nada disso: o Brasil afinal dá lições, dá baile, ensina, doutrina, ilumina, catequiza e “amassa” os europeus, ou seja, ainda é o único e aclamado país do futebol.
Essa euforia tem nome: “pachequismo”. Já lá vamos.
A depressão também: “viralatismo”, ou “complexo de vira-lata (cão rafeiro)”, expressão que Nelson Rodrigues cunhou (não por acaso a propósito de futebol, depois da cruel derrota da seleção brasileira no Mundial de 1950) para resumir o sentimento de inferioridade que alguns brasileiros têm em relação aos países desenvolvidos.
O “pachequismo”, por sua vez, refere-se à patologia daquele tipo de brasileiro que demonstra um nacionalismo cego (nascido de uma personagem publicitário, o Pacheco, criado a propósito, mais uma vez, do futebol antes do Mundial de 1982).
O futebol brasileiro é único do topo - nenhuma seleção, como a brasileira, jogou tantos e ganhou mais Mundiais e o Brasileirão é talvez o mais disputado de todos os campeonatos nacionais - à base - é fantástico ver Brasil afora, em milhares de campeonatos amadores mais organizados do que muitos torneios profissionais noutros países, o amor autêntico ao jogo.
E é também muito maltratado - tem um calendário desumano por culpa de dirigentes caciques abaixo da crítica - que o rebaixam.
Por causa disso, na psique dos brasileiros raramente está naquele ponto, entre a euforia e a depressão, tão importante para o bem-estar e a qualidade de vida a que os psicólogos e os psiquiatras dão o nome de equilíbrio emocional.
*Jornalista, correspondente em São Paulo