A Geração Z e as suas preocupações

A minha neta e os seus colegas de turma estão na casa dos treze anos de idade. São a franja mais jovem do que se convencionou chamar de Geração Z, os nascidos, já com um telemóvel na mão, entre 1995 e 2010. Frequentam uma escola belga que está inserida num meio internacional. Há alunos de várias nacionalidades. Tendo presente o contexto físico em que a escola se situa e o facto dos pais estarem em geral ligados a questões de defesa, seria expectável que estes adolescentes tivessem a questão da Ucrânia e os receios que Vladimir Putin causa como temas principais das suas conversas e preocupações. Não é assim.

A neta e os outros da sua classe sabem que há uma guerra na Europa. Adivinham que isso representa um assunto central no quotidiano de trabalho dos seus progenitores, embora a questão não seja discutida em casa, nem fora dos sítios autorizados. Mas Putin não preocupa sobremaneira estes jovens. Eles julgam que o mundo visto por Putin faz parte do passado ultranacionalista aberrante, das ditaduras, das polícias políticas e dos monstros corruptos.

O que de facto os preocupa, e muito, são o futuro do planeta em ligação com as alterações climáticas e as questões de género, mais concretamente, as imensas desigualdades que continuam a existir entre os homens e as mulheres, em matérias de política, de economia e de estatuto social. Quando António Guterres afirmou, há três semanas, que os direitos das mulheres continuam a ser abusados e violados, e que ao ritmo atual serão precisos três séculos para se conseguir a igualdade de género, foi ouvido com toda a atenção. As suas palavras foram assunto de debate na classe da minha neta. A mensagem que tiraram das palavras do Secretário-Geral pode ser resumida assim: isto é inaceitável e cabe à nossa geração tudo fazer para mudar esta triste realidade.

Também seguem Greta Thunberg com igual atenção. A ativista sueca tem agora 20 anos, mas pertence à mesma geração. O facto de não ter medo de falar perante os poderosos deste mundo, apesar da sua juventude, é muito admirado pelos mais novos. Curiosamente, não partilham as críticas que faz ao capitalismo, por acharem que a destruição do ambiente tem sido feita por todos os regimes, capitalistas declarados ou encapotados, norte-americanos ou chineses, e que as principais causas estão ligadas à ganância desenfreada do consumismo a que nos habituámos nos países mais desenvolvidos e à continuação dos investimentos nas energias fósseis.

Podemos não ter reparado que a 13 de março Joe Biden aprovou a exploração de petróleo numa vasta área do Alaska, o chamado projeto Willow. Mas a luz verde dada ao projeto não escapou à minha neta e aos seus colegas, que fizeram um dia de luto, de verdadeira tristeza, em protesto contra a decisão do presidente americano. Para além da destruição da natureza, a exploração dessa concessão irá produzir à volta de 280 milhões de toneladas de gases com efeito de estufa durante os 30 anos de vida útil do investimento, segundo estudos divulgados, que a turma pesquisou. Claro que a Administração Biden apresentou um conjunto de razões para justificar a aprovação. Mas a verdade é que os jovens estão numa idade em que não acreditam nos velhos profissionais da política e nas suas alianças com os grandes grupos petrolíferos e financeiros.

Confesso que admiro e desejo que perdure a determinação desta juventude. Muitos de nós sabemos que a nossa relação com a natureza e os nossos hábitos de consumo precisam de novos equilíbrios. Continuamos, porém, a viver as nossas rotinas e os nossos fingimentos de sempre. Embora haja progressos, como é o caso da resolução aprovada esta quarta-feira pela Assembleia Geral da ONU sobre a responsabilidade dos estados no que respeita à luta contra as alterações climáticas.

Fica-me, face à minha neta e aos seus pares, uma inquietação. Serão os jovens de hoje mais firmes e consistentes na luta pelas suas convicções do que nós, os da nossa geração, o fomos? Nós também acreditámos na necessidade de se construir um mundo mais justo, mais igual. Depois, com o passar dos anos, deixámos cair esses ideais e fomos capturados pelas armadilhas do consumo, da ostentação e do abuso dos recursos naturais, da indiferença perante a miséria dos outros, da manipulação e da alienação política. Por eles e pelo planeta, espero que isso não aconteça a esta nova geração.

Conselheiro em segurança internacional. Ex-secretário-geral-adjunto da ONU

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