A banca está a ser decente?

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Foi uma notícia que passou discretamente: o Banco Santander Portugal teve um lucro, nos primeiros nove meses deste ano, de 778,1 milhões de euros. O ano passado, para os mesmos primeiros nove meses do ano, os lucros foram de 621,7 milhões - uma melhoria de mais de 20%.

Explica a informação dada pelo próprio banco que esse resultado foi conseguido, sobretudo, graças à diferença entre o valor dos juros pagos aos clientes que lá depositam o seu dinheiro em relação aos juros cobrados aos clientes que lá vão pedir dinheiro emprestado: essa diferença subiu exatamente 20% em relação ao ano passado.

O busílis maior, porém, vem noutra notícia, dada exatamente no mesmo dia, mas em separado: nos primeiros nove meses deste ano o Santander Portugal desfez-se de 82 trabalhadores e fechou três agências bancárias.

O que mais me espanta é isto: numa altura em que a discussão pública de temas políticos, sociais ou económicos suscita sucessivas vagas de gritarias descontroladas nas redes sociais, opiniões inflamadas nos media tradicionais e intervenções dramáticas no estimável Parlamento, a relação mostrada nessas notícias entre maiores lucros da banca com mais despedimentos de trabalhadores, menos serviço para o público e juros muito baixos nos depósitos de quem poupa atravessou a vida pública em quase absoluto sossego e paz.

Atenção: aproveito esta notícia sobre o Banco Santander Portugal apenas para dar um exemplo que se estende a toda a banca, que, nos últimos anos de inflação e de subida de taxas de juro decretadas pela União Europeia, através do Banco Central Europeu, regista sucessivos recordes - o Santander não é melhor, nem pior que os outros, é igual.

Não acredita? Bem, Santander, BCP, BPI e Novo Banco tiveram juntos um lucro nestes nove meses de 2,5 mil milhões de euros, mais 11% que o ano passado, e todos eles seguiram estas mesmas políticas de “racionalização” e “cortes de gorduras”.

Ninguém vê aqui nada de errado? Com mais lucros é moralmente aceitável despedir? Com mais lucros é socialmente responsável fechar agências? Com mais lucros não era altura de fazer diminuir a diferença entre os juros dos depósitos e os juros dos empréstimos? Com mais lucros não era altura de a banca retribuir o favor que lhe fizemos, há 15 anos, quando a salvámos da crise financeira em que ela própria se meteu? Não podia, por exemplo, cobrar menos nos empréstimos à habitação ou no financiamento das empresas? E, ainda assim, reservar dinheiro para investimento e pagar adequadamente a acionistas?

Fomos treinados a aceitar acriticamente que temos de pagar os prejuízos da banca e festejar efusivamente quando obtém lucros, mesmo se ela nos retribuir a sabujice com menos empregos, pior serviço e sangramento dos rendimentos dos clientes. Comemos e calamos. E a isto chamamos mercado livre e, até, pasme-se, democracia!

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