O tudo em todo o lado ao mesmo tempo de Costa é um grande nada
Há que reconhecer a capacidade deste governo em apresentar decisões como quem anuncia o Óscar para o filme do ano. Infelizmente, o tudo em todo o lado ao mesmo tempo de Costa revela-se sempre uma narrativa sem substância. E as efabulações do gabinete, mesmo que assessoradas pelos melhores profissionais da propaganda política, são engolidas pela simples lógica.
O modelo é sempre o mesmo: toma-se um bode expiatório e sobre a sua suposta culpa constrói-se a narrativa para justificar um novelo de demagogia ideológica bacoca que apenas tem potencial destrutivo.
Foi assim com a pacotilha da habitação, apresentada pelo primeiro-ministro, pelo ministro das Finanças e pela ministra da Habitação como fonte no deserto, cujos cacos o governo ainda tenta apanhar depois de bombardeado pelo bom senso, remendando um tecido demasiado esgaçado para servir.
Construção e imobiliário, Alojamento Local e turismo tradicional, engenheiros e economistas rejeitaram a aberração soviética que imediatamente pôs em fuga milhões de euros de investimento e fez muitos senhorios deitar trancas à porta sem acrescentar uma só casa ao mercado. Bem pelo contrário.
Esquerda e direita disseram-no indefensável. As Regiões Autónomas anunciaram que não irão cumprir a lei, se avançar. Cavaco Silva, que encabeçava o governo que acabou com milhares de barracas e protagonizou o último grande programa de habitação do país, desfez os planos socialistas e foi desconsiderado, como sempre acontece quando o único detentor de quatro maiorias absolutas em Portugal lança um alerta. Mas depois o Presidente da República arrasou o plano do governo num par de entrevistas certeiras. E o PS, conhecendo o poder de Marcelo junto dos portugueses, engoliu o sapo e veio pedir clemência e "equilíbrio". Desengane-se, porém, os inocentes: Costa e companhia podem ter-se retirado do prime time onde cumpriram empreitadas de evangelização, mas continuam a achar que é o mundo que está errado. Não eles.
A estratégia do dedo apontado foi seguida noutros episódios. Como o da intempestiva demissão pública da CEO da TAP - em fuga para a frente após saber-se que a indemnização a Alexandra Reis, escolhida por Medina para as Finanças, fora validada pelo então ministro Pedro Nuno Santos -, alegando uma justa causa que o governo procura agora desesperadamente justificar. A trapalhada está longe de ter terminado com a expulsão de Christine. E o objetivo de escapar a consequências políticas e à (obviamente inevitável) compensação milionária torna-se ainda mais improvável com a transportadora a atingir lucros dois anos antes do prazo e a concluir o plano de emagrecimento que tornará viável a reprivatização agora defendida por quem há três anos a nacionalizou pela sua honra.
Foi também o argumento de ficção que se seguiu no caso das criminosas suspeitas lançadas sobre os supermercados quanto a um aumento de preços que é comprovada consequência do encarecimento dos fatores de produção em toda a cadeia, fruto do deficiente desenho dos apoios públicos e do inexplicável atraso de meio ano na chegada de remédios que deviam ter sido aplicados aos primeiros sintomas inflacionistas, mas foram apenas usados como paliativos quando o mal já se espalhara inexoravelmente.
Agora, após um ano com o aspirador fiscal em superturbo e quando Bruxelas e Frankfurt avisam que acabou-se o tempo de subsidiar, sob pena de os juros subirem ainda mais e com ainda mais violência para segurar as tendências inflacionistas que ainda não recuam como devem, Costa apresenta-se como o salvador. Aquele que vem em nome de produtores e famílias devolver os impostos que cobrou como nunca antes. Too little, too late, senhor primeiro-ministro. O mal está feito e os efeitos destes novos apoios - a existirem, o que, como temos visto, não é garantido - não serão sentidos nos próximos meses. As famílias continuarão a debater-se, as empresas a enfrentar dificuldades. E a culpa, a única culpa, é do governo. Por atos e omissões, atrasos e incapacidade, por incompetência dolosa.
Os impostos pagos pelos portugueses em 2022 somaram perto de 60 mil milhões de euros (+13,8%), com o IVA a render mais 18,8% do que um ano antes, apesar de o consumo só ter crescido 5,9%. Foram os contribuintes que financiaram os brilharetes nas contas públicas e as esmolas - não apoios - que receberam.
Uma receita fiscal caída do céu, enquanto o povo se distrai a culpar o AL e os vistos gold e os que aqui investem e a CEO da TAP e os malvados empresários que conseguem lucros - que também engordam os cofres de Medina e Costa (+43,9% de receita de IRC inscrita na Execução Orçamental de dezembro).
Portugal chega assim a 2023 com uma almofada de 3,2 mil milhões de euros - cinco vezes o valor estimado por Medina para satisfazer as reivindicações dos professores, que o ministro das Finanças já avisou que não irá acolher. Será antes usada para aplacar mais défice e dívida, restando uns trocos para financiar os anúncios de António Costa, o benemérito, a distribuir côdeas aos esfomeados.
Empresários, banqueiros, líderes setoriais com visão, provas dadas e vontade de ajudar a melhorar o país juntaram-se por um dia. Não foram queixar-se nem pedir nada, mas antes disponibilizar-se para ajudar Portugal a melhorar. O grupo que reúne os 42 homens e mulheres que mais riqueza criam, que mais emprego dão no país, sentaram-se com académicos e estudantes, economistas e gestores de topo para abrir autoestradas para acelerar o crescimento.
Apostar na educação - muito além dos jovens - e na expansão global das empresas, ambicionar a riqueza e a progressão, pôr o elevador social a funcionar são caminhos de um resultado potencial incrível. Basta ver que, entre 1,3 milhões de empresas no panorama nacional, 1% (incluindo as 1300 maiores) traz 57% do Valor Acrescentado Bruto do país, quase dois terços das exportações, metade dos gastos com pessoal e 71% dos impostos pagos. Fazer crescer mais uma centena e meia permitiria multiplicar tudo isto.
E quantos governantes estavam na sala a ouvir e tirar notas? Quantos contactos levaram para dar seguimento às ideias ali partilhadas? Que resposta teve o repto da Associação Business Roundtable Portugal dos decisores políticos? Um redondo zero - ainda que o primeiro-ministro tivesse sido convidado a falar. Marcelo fez questão de comparecer, mas no governo ninguém julgou pertinente marcar presença. A evidência, se preciso fosse, do inexplicável desprezo de quem governa por quem gera a riqueza neste país.