O sangue azul e os plebeus

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O futebol de Espanha de hoje é o do Portugal de ontem. Mas com

base científica, sangue azul e, detalhe importante, títulos.

o Euro2012

O futebol que se jogava em Portugal nos anos 90 - do pé de Paulo

Sousa para o de Rui Costa, do de Rui Costa para o de JVP e assim

sucessivamente - era herdeiro do futebol do FC Porto de Pedroto dos

anos 70 e 80 - do pé de Frasco para o de Sousa, do de Sousa para o

de Jaime Pacheco e assim sucessivamente. Pedroto bebera este modelo,

nos anos 50, da Académica de Cândido Oliveira, que é, em última

análise, o pai do "futebol à antiga portuguesa". Um estilo de

jogo desconsiderado porque, ao contrário do famigerado tiki-taka,

não rendeu títulos à seleção a não ser o depreciativo título

de "campeão do mundo sem balizas".

O tiki-taka, por seu lado, foi desenvolvido em La Masía, a escola

de futebol do Barcelona e Silicone Valley da bola. Guardiola levou-o

no século XXI a patamares de excelência, depois de ter aprendido

com Cruijff nos anos 90, que aprendera com Rinus Michels nos 70, que

aprendera com Jack Reynolds, treinador do Ajax nos anos 40.

No fundo, no fundo, o que o quase anónimo Reynolds defendia era o

mesmo que o quase anónimo Cândido ensinou e cujas raízes estão

nos primeiros grandes mestres do futebol: os húngaros. No fundo, no

fundo, o "futebol à antiga portuguesa" e o tiki-taka são, como

os seus países, vizinhos. Só que o segundo tem mais sangue azul,

cruzado entre catalães e holandeses da família real do futebol, e o

primeiro ares de plebeu lusitano.

Mas tudo isto é história. Da mesma forma que Espanha durante

anos jogou à base da raça e do orgulho (as escolas basca e

madrilena) e não do tiki-taka, o Portugal de hoje também rompeu com

o estilo de jogo do alentejano Cândido de Oliveira. Joga à

madeirense. E à algarvia. Como CR7 e Moutinho, os dois jogadores

mais importantes às ordens de Paulo Bento.

O primeiro, além de genial, só vê a baliza. O segundo, cuja

correção posicional foi uma das chaves para a melhoria de Portugal,

é de uma economia de processos rara no futebol nacional. É um

Frasco pragmático, um Frasco do século XXI.

Portugal estará por isso hoje na invulgar condição de equipa

mais objetiva em campo. Os olhos do mundo estarão mais na força

espanhola sobre a bola do que na inteligência portuguesa de a

roubar. Espanha entrará hoje na Donbass Arena com a força de um

touro. Que Portugal tenha a inteligência de um toureiro. Olé!

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