O futuro incerto da União Europeia
A União Europeia para se desenvolver como bloco coeso precisa de manter um fluxo de financiamento aos países mais fracos sob pena de perder a sua atratividade. Resulta, assim, que alguns países são contribuintes líquidos e outros beneficiários líquidos do orçamento da União Europeia. O fluxo de financiamento implica a saída de fundos dos países mais ricos e a sua canalização para os países mais fracos.
O primeiro grande golpe nesta arquitetura financeira foi dado pelo Brexit, que significou a saída da União do segundo maior contribuinte líquido, o Reino Unido. Apesar da saída negociada e faseada os efeitos fizeram-se sentir imediatamente ao nível da contração dos diversos fundos públicos de apoio aos países mais fracos, como Portugal.
A resposta ao Covid foi já um forte sinal de que a União Europeia não conseguia financiar a retoma económica. Teve de lançar empréstimos, de dívida pública garantida pela União, isto é por todos os Estados membros. Já não se tratou de apoio financeiro mas de emissão de dívida conjunta, embora tecnicamente não imputada à dívida de cada país. Um sinal de que a solidariedade não está a funcionar.
Que países são contribuintes líquidos? O grande contribuinte líquido é a Alemanha (40%) e, depois, mas a grande distância a França (17%) e a Itália (15%) que formam um segundo grupo e por último um conjunto de pequenos países que são também pequenos contribuintes líquidos: a Holanda (11%), a Suécia (4%), a Áustria (3%), a Dinamarca (3%), a Finlândia (1%) e a Irlanda (1%). Análise sobre o ano de 2018; exclui-se o Reino Unido da análise uma vez que as suas contribuições vão cessar (ver aqui).
Percebemos assim que a Alemanha é o grande contribuinte para a sustentação da União Europeia. Por isso a seguir à reunificação (1989) se seguiu um período de menor ímpeto da União Europeia uma vez que os alemães se viraram para dentro procurando digerir os custos de integração da República Democrata Alemã.
Com a guerra entre os Estados Unidos e a Rússia na Ucrânia e fruto das sanções americanas de proibição da compra de gás e petróleo russo, a Alemanha terá que passar por uma profunda reestruturação industrial se não quiser perder a sua posição de maior potência económica europeia. Será uma reestruturação dolorosa, cara e demorada. Terá a Alemanha o músculo financeiro para continuar a financiar a União Europeia?
A Alemanha saí desta guerra humilhada - até pela Ucrânia que recusou receber o atual presidente alemão - obrigada a renegar o seu anterior chanceler, Gerhard Schröder, que governou entre 1998 e 2005 e, provavelmente, forçada a fazer o mesmo com Ângela Merkel. A preponderância política na União está a passar para os chamados países da linha da frente como a Polónia, países, contudo, que não têm a menor capacidade económica para agregar um bloco como a União Europeia.
A França e a Itália também saem enfraquecidas da guerra, quer pelos efeitos das sanções, quer pela grande visibilidade mundial da sua irrelevância no curso dos acontecimentos. A Itália é um país já muito endividado não tendo capacidade para se tornar o grande contribuinte da União. A França na sua simbiose político-económica com a Alemanha também não.
Diplomaticamente pelo mundo fora a União Europeia é hoje vista, não como uma potência de direito próprio, mas como um protetorado americano, ocupada por mais de 100.000 soldados americanos aqui estacionados para nos defender. Incapaz de uma estratégia própria, subordinada ao seu aliado do outro lado do Atlântico.
A reconstrução da Ucrânia é uma oportunidade económica de grande dimensão que ajudaria seguramente parte da economia europeia a recuperar. Contudo ela pressupõe que a Rússia não anexe ou controle grande parte do país. Ora tal hipótese está longe de se poder dar como certa.
Espera-se, assim, que os próximos pacotes de fundos europeus sejam mais magros e cada vez mais assentes na emissão de dívida e não no contributo líquido de alguns Estados membros. Para Portugal não são boas notícias. Alternativas precisam-se.
O longo período de estagnação e empobrecimento relativo em que Portugal mergulhou nos últimos 30 anos arrisca-se a prolongar-se pelas próximas décadas.