Viktor Orbán à procura do terceiro mandato consecutivo

Sistema eleitoral, desenhado quando conquistou a primeira supermaioria, beneficia o partido do primeiro-ministro. Esperança da oposição é o voto tático, para lhe tirar a maioria
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Na chefia do governo húngaro desde 2010, após uma primeira passagem entre 1998 e 2002 e os oito anos seguintes na oposição, Viktor Orbán prepara-se hoje para uma nova vitória eleitoral e um quarto mandato para tornar "irreversíveis" as mudanças que tem empreendido. O balanço é dúbio: se por um lado o primeiro-ministro ajudou a recuperar a economia, por outro o nível de corrupção está a aumentar e é acusado de deriva autoritária. E se a sua oposição à imigração lhe valeu apoios e votos em casa, causou mau estar nos parceiros da União Europeia.

As sondagens dão a Orbán uma maioria folgada, com o Fidesz (centro-direita nacionalista) com 45% de apoio, face aos 20% de Jobbik (extrema-direita) e aos 19% da aliança entre socialistas e verdes (MSZP). A oposição, que inclui mais uma dezena de partidos (alguns alegadamente criados só para ganhar dinheiro), está dividida, enfrentando também um sistema eleitoral que a desfavorece. A única esperança dos opositores é que os 46% de húngaros que dizem querer uma mudança de governo votem de forma tática e tirem a supermaioria ao primeiro-ministro, impedindo-o de consolidar o poder.

As leis eleitorais, alteradas depois de Orbán ter conquistado uma maioria de dois terços do Parlamento em 2010, favorecem o Fidesz - com uma base de 2,5 milhões de eleitores. Dos 199 deputados, 106 são eleitos por cada uma das 106 circunscrições e os mapas foram redesenhados, alegadamente para beneficiar o partido do primeiro-ministro. O candidato mais votado, numa única volta que impede alianças entre idas às urnas, é o vencedor - em 2014, o Fidesz conquistou 96 das 106 circunscrições apesar de só ter tido maioria absoluta em 20.

Num revés para Orbán, nas eleições municipais extraordinárias em Hódmezovásárhely, em fevereiro, um candidato independente apoiado por todos os partidos da oposição derrotou o do Fidesz. O que prova que, se nas legislativas essa união se repetisse nas circunscrições, a oposição podia, pelo menos, tirar a esperada maioria a Orbán. As sondagens mostram que os eleitores estão dispostos a votar de forma tática, para o derrotar.

Segundo dados da Zavecz Research, citados pela Reuters, quase um terço dos apoiantes do Jobbik (extrema-direita) disseram em março estar dispostos a votar em candidatos da esquerda (eram 19% em fevereiro). À esquerda, 43% (eram 26% um mês antes) admitiram votar pelo Jobbik caso fosse necessário. De acordo com esta empresa de sondagens, a oposição precisa de ganhar entre 40 a 45 circunscrições para retirar a maioria a Orbán.

Um site, Tactical Voting, tem vindo a identificar quais são os opositores com maior probabilidades de ganhar e está a passar a informação aos eleitores interessados nesse voto tático para derrotar o primeiro-ministro. No centro de Budapeste, por exemplo, o candidato da aliança MSZP desistiu a favor de outro partido ecologista, acontecendo o contrário noutra circunscrição da capital. Mas foi um gesto raro, porque é difícil um entendimento que implica desistir de ir a votos e pode ter custos elevados para o partido.

Os restantes 93 deputados são distribuídos proporcionalmente de acordo com os votos nas listas nacionais - cada eleitor vota, portanto, duas vezes. Em muitos sistemas eleitorais, os votos nos candidatos derrotados nas circunscrições são considerados "perdidos" e, por isso, somados à lista nacional. No sistema húngaro, que a OCDE considerou há quatro anos "livre, mas não justo", os votos dos candidatos vencedores que estão acima do necessário para vencer, são também incluídos nessas listas. Em 2014, já com estas regras, o Fidesz voltou a conquistar uma supermaioria, apesar de ter tido apenas 45% dos votos dos oito milhões de eleitores.

Finalmente, o governo de Orbán deu a cidadania (e o direito de voto) às minorias de etnia húngara que vivem nos países vizinhos, como resultado do tratado de Trianon que estabeleceu as fronteiras do país no final da Grande Guerra. Em 2014, 130 mil "novos" cidadãos, a maioria da Roménia e da Sérvia, votaram maioritariamente no Fidesz. Um voto nas listas nacionais que é possível por correio, ao contrário do que acontece com os milhares de emigrantes húngaros. Estes, que não votam necessariamente no partido de Orbán, têm que se deslocar às embaixadas ou consulados para depositar o voto - há quatro anos só 24 mil o fizeram.

Democracia iliberal
Orbán, que surge ligado a uma ideia de democracia iliberal (onde se limitam certas liberdades em nome do interesse nacional) já disse que irá tomar medidas "morais, políticas e jurídicas" contra os adversários, após as legislativas. No poder, já aprovou centenas de leis e empreendeu reformas dos media, da justiça, da economia, da cultura - marcando um recuo nos valores democráticos e atraindo as críticas da oposição e de observadores internacionais. Para os seus apoiantes, Orbán expurgou os vestígios do comunismo , que caíra em 1989.

Um dos principais beneficiários dos fundos europeus, que contribuíram para a recuperação económica, a Hungria tem vindo a afastar-se da União Europeia. Em 2015, liderou os países contra o sistema de quotas para acolhimento de refugiados e a Comissão Europeia lançou nos últimos meses um procedimento de infração contra Budapeste por causa das leis que reforçam o controlo sobre as organizações da sociedade civil e ameaçam uma universidade financiada por George Soros - que Orbán considera o seu arqui-inimigo. O milionário americano nascido na Hungria chegou a acusar o primeiro-ministro de criar um "estado mafioso". Em Bruxelas há quem queira ir mais longe e usar o artigo 7.º do Tratado da UE, que prevê a suspensão de direitos - até o de voto no Conselho.

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