Vietname aprova polémica lei da cibersegurança
O Vietname aprovou esta terça-feira uma polémica lei de cibersegurança que, segundo os críticos, prejudicará a economia e restringirá ainda mais a liberdade de expressão.
A lei exige que os provedores de serviços como o Google e o Facebook armazenem dados de utilizadores no Vietname, abram escritórios no país e removam conteúdos ofensivos em 24 horas a pedido do Ministério da Informação e Comunicações e do grupo de trabalho de cibersegurança, que funciona na dependência do Ministério da Administração Interna.
Dirigindo-se à assembleia dominada pelo Partido Comunista antes da votação, o presidente do Comité de Defesa e Segurança, Vo Trong Viet, disse que a lei é "extremamente necessária para defender os interesses do povo e a segurança nacional".
Viet afirmou que a lei não contradiz os compromissos do Vietname com tratados comerciais multinacionais como os da Organização Mundial do Comércio e da Parceria Transpacífico, mas lembrou que há exceções por motivos de segurança nacional.
Exigir que as empresas estrangeiras instalem centros de dados no Vietname, acrescentou, pode aumentar os seus custos operacionais, mas era necessário para a segurança cibernética do país e facilitará as operações das empresas e as atividades dos utilizadores.
"Nos casos de atos de violação da segurança cibernética, a coordenação no tratamento das violações será mais eficaz e mais viável", disse Viet, sem dar mais detalhes.
Estima-se que 70% dos 93 milhões de habitantes do Vietname estejam 'online' e cerca de 53 milhões de pessoas tenham contas no Facebook.
Jeff Paine, diretor da Coligação Ásia Internet, uma associação do setor que inclui a Google e o Facebook, disse que o grupo ficou desapontado com a aprovação da lei, cujos requisitos sobre localização de dados, controlo de conteúdo e exigências de escritórios locais dificultarão as ambições do país no âmbito do PIB (Produto Interno Bruto) e do crescimento de emprego.
"Infelizmente, estas cláusulas resultarão em severas limitações à economia digital do Vietname, reduzindo o clima de investimento estrangeiro e prejudicando as oportunidades para negócios locais e para as pequenas e médias empresas florescerem dentro e fora do Vietname", acrescentou.
A Associação de Comunicações Digitais do Vietname defende que a nove lei vai reduzir o crescimento do PIB em 1,7% e baixar o investimento estrangeiro em 3,1%.
O Facebook não fez ainda qualquer comentário sobre a nova legislação.
Os Estados Unidos e o Canadá tinham apelado ao Vietname para adiar a aprovação da nova legislação.
A embaixada dos EUA informou na semana passada que via na então proposta de lei "sérios obstáculos para a segurança digital do Vietname e o futuro da inovação digital" e que poderia "não estar de acordo com os compromissos comerciais internacionais" do país.
Já a Amnistia Internacional (AI) defendeu que esta decisão terá consequências potencialmente devastadoras para a liberdade de expressão.
"No clima profundamente repressivo do país, o espaço 'online' era um refúgio relativo, onde as pessoas podiam partilhar ideias e opiniões com menos medo da censura por parte das autoridades", disse Clare Algar, diretora de operações globais da AI.
"Esta lei só pode funcionar se as empresas de tecnologia cooperarem com as exigências do Governo para entregar dados privados. Essas empresas não devem ser coniventes com quaisquer abusos de direitos humanos e nós instamo-los a usarem o poder considerável que têm para desafiar o Governo do Vietname quanto a esta legislação regressiva ", disse.
A legislação aprovada esta terça-feira tem sido alvo de diversas críticas e provocou manifestações no país. No domingo à noite, pelo menos 102 manifestantes foram detidos durante protestos na província de Binh Thuan, sul do Vietname, contra as novas leis de cibersegurança e de criação de zonas económicas especiais.
A polícia disse que 102 pessoas tinham sido detidas, enquanto o portal de notícias VnExpress referiu que as centenas de pessoas que se concentraram frente a um edifício da administração pública lançaram objetos contra as autoridades e incendiaram veículos do Estado.
As autoridades dispararam granadas de gás lacrimogéneo e usaram canhões de água para dispersar a multidão.
No Vietname as manifestações são proibidas pelo Governo, do Partido Comunista.
A situação resolveu-se por volta da meia-noite, após a intervenção dos efetivos do Ministério da Segurança Pública.
No domingo, milhares de pessoas manifestaram-se também nas principais cidades do país contra os projetos de lei do Governo, que acabaram por ser aprovados esta terça-feira.