Trump nega ter chamado "otários" a militares mortos em combate
Trump e os seus próximos passaram as últimas horas a defender as alegações de que ridicularizou os veteranos das forças armadas, após a publicação de um texto demolidor na revista The Atlantic com o título "Trump: os americanos que morreram na guerra são 'falhados' e 'otários'".
O artigo, escrito pelo diretor da revista Jeffrey Goldberg, citou quatro fontes anónimas que disseram que Trump se referiu aos Marines que morreram na Primeira Guerra Mundial como "falhados" e "otários" e relatou vários outros episódios de Trump a fazer comentários cruéis sobre militares.
"Trump recusou a ideia da visita porque temia que os seus cabelos ficassem em desalinho na chuva, e porque não acreditava que fosse importante honrar os mortos da guerra americana, segundo quatro pessoas conhecedoras em primeira mão da discussão daquele dia", lê-se. "Numa conversa com altos funcionários na manhã da visita programada, Trump disse: 'Porque deveria eu ir àquele cemitério? Está cheio de falhados'. Numa outra conversa na mesma viagem, Trump referiu-se aos mais de 1.800 fuzileiros que perderam as suas vidas em Belleau Wood como 'otários' por terem sido mortos."
Além da The Atlantic, a agência Associated Press confirmou as histórias através de duas fontes e, o que é mais surpreendente, dada a sua colagem editorial ao presidente, a Fox News também corroborou a veracidade do ocorrido.
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O presidente norte-americano não escondeu a sua deceção pela informação prestada pela jornalista Jennifer Griffin e, também no Twitter, pediu o seu despedimento. "Devia ser demitida por este tipo de notícias", escreveu.
Em relação à The Atlantic, em maio Trump exultou com as dificuldades financeiras da mesma: "Excelentes notícias: a aborrecida mas muito perversa revista The Atlantic está a falhar rapidamente, pelo cano abaixo, e acaba de ser forçada a anunciar que está a despedir pelo menos 20% do seu pessoal para conseguir coxear no futuro. Este é um momento difícil para estar no negócio das notícias falsas!"
A caracterização de Trump como um comandante em chefe que em privado denigre os veteranos quando em público os elogia e afirma ser o maior apoiante, é encarada como um risco político antes das eleições presidenciais de 3 de novembro. Embora, como lembra o diretor da Atlantic, o ataque contínuo ao senador republicano John McCain, considerado um herói de guerra, não o prejudicou minimamente na eleição de 2016. A revista revela que quando McCain morreu, em 2018, Trump ficou furioso pelo facto de as bandeiras estarem a meia haste. "Por que estamos a fazer esta merda? O tipo era um falhado de merda", disse aos assessores, segundo as fontes, que falaram sob a condição do anonimato.
No Twitter, Trump fez desmentidos e além de ter menorizado outra vez o papel de McCain, em especial em relação aos veteranos (quando foi um dos três autores da legislação que permite aos antigos militares mais opções nos cuidados de saúde), disse que nunca chamou "falhado" a McCain, o que é uma afirmação mentirosa e facilmente confirmável, até no próprio Twitter de Trump.
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Aos jornalistas, Trump sugeriu que a fonte da notícia foi o seu antigo chefe de gabinete da Casa Branca, John Kelly, e disse que o ex-general "foi incapaz de lidar com a pressão deste trabalho".
Em declarações à NPR, e sem obviamente confirmar que uma das fontes seria Kelly, o diretor da Atlantic recorda o insulto que Trump dirigiu ao ex-militar em 2017, quando este era secretário da Segurança Interna, numa visita ao cemitério de Arlington. Junto aos mortos em serviço e ao lado do túmulo do filho de Kelly, um oficial dos Marines morto aos 29 anos no Afeganistão, Trump divagou: "Não percebo. O que é que eles ganharam com isso?" Daí, conclui Goldberg, "o cerne aqui e o que é perturbador é que ele vê a morte na guerra como uma prova de que se é uma espécie de otário. Lembre-se do que disse sobre John McCain; que, ele gosta de tipos que não são capturados".
O candidato democrata Joe Biden foi rápido ao abordar a questão, chamando "repugnantes" os alegados comentários de Trump e pedindo-lhe que pedisse desculpa. Num comunicado afirmou que se as alegações do artigo forem verdadeiras, "são mais um marco de quão profundamente" ambos discordam "sobre o papel do presidente dos Estados Unidos".
"Se eu tiver a honra de servir como o próximo comandante em chefe, garantirei que os nossos heróis americanos saibam que os protegerei e honrarei o seu sacrifício - sempre", disse Biden.
"Quem diabos pensa ele que é?" disse mais tarde Biden. "Como se sentiria se tivesse um filho no Afeganistão neste momento? Como se sentiria se perdesse um filho ou filha, marido, mulher? Como se sentiria, a sério? Mas sabe no seu coração, sabe no seu interior: é deplorável."
O almirante reformado James Stavridis, ao partilhar o artigo da The Atlantic no Twitter, descreveu os cemitérios militares como "santuários sagrados para aqueles que deram tudo" e sugeriu que a ausência de desmentidos por parte de John Kelly e do general Jim Mattis, então secretário de defesa de Trump, era notória.
"A frase: 'chocante se for verdade' está a ficar gasta", Stavridis tuitou. "A inexistência de desmentido por parte dos meus amigos generais Kelly e Mattis sugere que o choque está bem aplicado."
Acérrima crítica de Trump, a senadora democrata Tammy Duckworth, uma veterana que perdeu ambas as pernas em missão no Iraque, disse que o presidente Trump "gostava de usar o exército americano para o seu próprio ego".
Do lado da Casa Branca, a própria mulher de Trump, Melania, escreveu uma mensagem a declarar que a notícia é uma mentira. Enquanto os antigos funcionários Mick Mulvaney e Sarah Sanders rejeitaram a notícia, o secretário de Estado Mike Pompeo disse apenas que não ouviu aquelas palavras por parte de Trump. Também o secretário da Defesa, ao Politico, enquanto afirmou que Trump tem grande respeito pelos militares não negou a factualidade da notícia.