Trump abandona mesmo o acordo nuclear com o Irão. Congresso já foi informado

Vice-presidente Mike Pence comunicou ao Congresso que presidente irá anunciar a desvinculação dos EUA do acordo sobre o nuclear iraniano

A notícia foi avançada pela CNN quando faltavam 20 minutos para a hora prevista para o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tornar pública a sua decisão. Segundo a CNN, que avançou a notícia, o vice-presidente Mike Pence teria comunicado a decisão de Trump aos membros das duas Câmaras do Congresso. A desvinculação dos EUA era o cenário considerado mais previsível.

O presidente americano está obrigado por lei a indicar ao Congresso a cada 90 dias se considera estar o Irão a cumprir o acordo. Em janeiro de 2018 prolongou a suspensão das sanções económicas mas exigiu aos parceiros europeus uma solução até 12 de maio para aquilo que classificou como "terríveis lacunas" do acordo. O facto de ter antecipado a divulgação da sua decisão antes da data que estabelecera como limite foi, desde logo, considerado como sinal evidente que iria denunciar o acordo.

Trump sempre considerou o acordo muito favorável ao Irão por não abranger o programa de mísseis balísticos deste país assim como os diferentes tipos de envolvimento e influência do regime de Teerão no Médio Oriente, da presença militar na guerra civil na Síria ao apoio ao Hezbollah libanês e ao Hamas palestiniano, assim como a sua intervenção no conflito no Iémen. Pouco antes do anúncio do vice-presidente, um responsável da Casa Branca, Marc Short, dissera aos jornalistas "não haver dúvidas que o Irão tem causado muitos problemas no Médio Oriente. Não parece muito preocupado em cumprir o acordo". Segundo Short, para Trump é fundamental que o Irão deixe de ser "uma nação que subsidia o terrorismo e quer atacar Israel".

O acordo foi assinado a 14 de julho de 2015, em Viena, entre os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas (China, Estados Unidos, França, Reino Unido e Rússia), mais a Alemanha e o Irão, e nele se consagrava o fim progressivo e condicional das sanções internacionais em troca da promessa de Teerão não desenvolver armas nucleares. Entrou em vigor em janeiro de 2016. Trump anunciara segunda-feira no Twitter que tornaria pública esta tarde a sua decisão.

O documento assinado em Viena demorou quase dois anos a ser negociado e no mais recente relatório da Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA), divulgado em fevereiro, era indicado que o Irão estava a respeitar os compromissos assumidos no quadro do acordo. Mais recentemente, após Israel ter denunciado a existência de um programa nuclear paralelo e secreto do Irão, a AIEA garantiu não ter encontrado qualquer indício nesse sentido.

Durante a tarde foram-se multiplicando as notícias que davam como adquirido que os EUA iriam deixar o acordo. O The New York Times (NYT) citava fonte diplomática para escrever que, numa conversa telefónica sucedida entre o presidente americano e o seu homólogo francês, Emmanuel Macron, Trump dissera que não só os EUA iriam deixar o acordo, como seriam restabelecidas todas as sanções e impostas novas. A Casa Branca recusou comentar a notícia avançada pelo NYT. Por seu lado, o Eliseu desmentiu a notícia do jornal, indicando que "o presidente Trump não comunicou a sua decisão ao presidente Macron". Este teve ainda uma conferência telefónica com a primeira-ministra britânica, Theresa May, e com a chanceler Angela Merkel.

A denúncia dos EUA do acordo de Viena, na opinião de vários analistas, pode originar uma escalada de tensões no Médio Oriente e ter repercussões no preço do petróleo. Ao início do dia, a cotação do petróleo estava em queda, mas após a notícia do NYT, voltaram a subir. O Irão é um importante produtor petrolífero e o regresso das sanções americanas tornará mais difícil a Teerão a sua venda. O Irão é atualmente o sexto maior produtor mundial e o terceiro maior da OPEP, com uma produção de 3,8 milhões de barris por dia.

Do lado iraniano, alguns dirigentes tornaram claro que o seu país não aceitaria quaisquer novas restrições além das estabelecidas no acordo de 2015. Sob anonimato, um alto responsável declarara à Reuters estar ao corrente de que "os europeus tentam persuadir Trump a não deixar o acordo [sugerindo novas condições] mas o Irão nunca aceitará qualquer exigência que não esteja já estabelecida". Um outro alto dirigente, o presidente do Parlamento, Ali Larijani (que no passado esteve envolvido nas negociações sobre o nuclear do seu país) acusou os EUA de "não cumprirem os seus compromissos. Só se pode falar com os americanos com a linguagem da força. Não há outra solução".

No final da visita que realizou aos Estados Unidos, o presidente francês mostrara-se bastante pessimista, dizendo que, muito provavelmente, Trump iria "deixar o acordo por razões de política interna. Ao mesmo tempo, defendeu a negociação de "condições mais firmes" numa tentativa de salvaguardar o acordo.

Além de Paris, também Londres e Berlim, continuando a defender a necessidade de preservar o acordo, aceitaram a ideia de novas negociações. "Estamos determinados a salvar o acordo porque este preserva o mundo da proliferação nuclear", declarou o responsável da diplomacia francesa, Jean-Yves Le Drian. O seu homólogo alemão, Heiko Maas, manifestou-se no mesmo sentido e salientou que a saída dos EUA do acordo pode abrir caminho a "uma escalada" no Médio Oriente.

Por seu lado, a Rússia e a China defendem a atual versão, sem novas negociações.

Alguns dirigentes iranianos ameaçaram no passado recente que o seu país deixaria o acordo, a confirmar-se a saída dos EUA, e relançar o programa nuclear e acelerar o dos mísseis balísticos, enquanto outros manifestaram a intenção de continuar a cumpri-lo, se Paris, Londres e Berlim dessem garantias suficientes de que seria cumprido na sua atual forma.

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