Regime de Assad prepara última ofensiva na região de Damasco
As forças do regime de Bashar al-Assad deram ontem um ultimato de 48 horas para os grupos rebeldes abandonarem os quatro últimos enclaves na área de Damasco ainda sob seu controlo ou serem alvo de uma ofensiva militar semelhante àquela que permitiu a recente reconquista de Ghouta oriental. O enclave mais importante está ocupado por elementos do Estado Islâmico (EI) desde 2015 e abrange aquele que era o maior campo de refugiados palestinianos na Síria antes do início do conflito em 2011, Yarmouk.
As agências referiam que boa parte da população já teria abandonado Yarmouk, mas alguns milhares permaneceriam no campo, não havendo a certeza se estariam ou não sob coação dos islamitas.
A notícia do ultimato surgiu pouco antes de se saber, a partir de Bagdad, que aviões F-16 da força aérea iraquiana tinham bombardeado posições do EI em território sírio perto da fronteira comum. Segundo um porta-voz das forças armadas iraquianas, o ataque foi realizado "em coordenação" com Damasco e visou neutralizar "uma ameaça à segurança do Iraque".
Com a previsível saída dos grupos rebeldes e islamitas dos enclaves na região de Damasco, a oposição passa a controlar apenas porções da Síria situadas no noroeste e sudoeste do país. Uma importante alteração face à situação que se vivia em 2015, época em que quase dois terços do território sírio escapavam ao controlo do regime. Desde então, com importante envolvimento militar da Rússia e da Síria, as forças fiéis a Assad têm vindo a reconquistar os principais centros urbanos. O conflito, que entrou no oito ano, já causou mais de 500 mil mortos.
Numa daquela cidades, Douma, onde sucedeu a 7 de abril o ataque com armas químicas que originou a retaliação do último sábado, os inspetores da Organização para a Proibição das Armas Químicas (OPAQ) continuavam ontem a serem impedidos de a visitarem. Os elementos da sua escolta foram alvejados na quarta-feira enquanto realizavam uma visita exploratória à cidade. Segundo o ministro adjunto dos Negócios Estrangeiros russo, Mikhail Bogdanov, citado pela RIA, seriam os grupos rebeldes que tentavam impedir os inspetores da OPAQ de se deslocarem a Douma. Para o regime de Assad, e seus aliados russos e iranianos, o ataque químico foi realizado pela oposição.
Para os dirigentes ocidentais, Damasco e Moscovo procuram destruir as provas do ataque de 7 de abril. Um responsável do Pentágono, o tenente-general Kenneth McKenzie, afirmava ontem que, apesar da operação conjunta dos Estados Unidos, França e Grã-Bretanha de sábado, o regime de Assad continua a "ter capacidade para realizar ataques limitados no futuro", mas considera que o preço a pagar por isso - ou seja, mais ataques das forças ocidentais - terá um efeito dissuasor.
Força internacional
Com o presidente Donald Trump apostado em retirar as tropas que estão na Síria e reduzir o esforço americano no conflito sírio, intensificam-se as iniciativas para criar uma coligação árabe que possa estabilizar a situação no terreno.
Os EUA estariam interessados no envolvimento da Arábia Saudita, que no passado já se mostrou disponível para o efeito, o Egito, Jordânia, Bahrein, Koweit, Emiratos Árabes Unidos, Qatar e Omã, até como forma de servir de freio à crescente influência do Irão na Síria. Esta semana, o ministro dos Negócios Estrangeiros saudita, Adel bin Ahmed Al-Jubeir, reconheceu estarem a decorrer negociações sobre o assunto.
A criação de uma força internacional de Estados árabes não é, contudo, sinónimo de estabilização na Síria. Além das unidades iranianas e do Hezbollah libanês e da Rússia, há tropas turcas no interior do país e a presença de uma força militar, predominantemente, de países sunitas do Golfo pode ser fonte suplementar de tensão. A somar ao conflito latente entre Israel e o Irão exemplificado pelo ataque no início do mês à base de Tiyas, na Síria, de onde teria partido um drone iraniano armado. A mesma base já fora atacada em fevereiro na sequência de um incidente envolvendo também um drone iraniano.
À medida que Damasco recupera controlo de território, aumenta também a perspetiva das forças iranianas avançarem para regiões fronteiriças com Israel, com o risco implícito de conflito. Um conflito em que a superioridade militar israelita poderia ser posta em causa. A Bloomberg revelava ontem que a Rússia estaria a "reconsiderar" a entrega de mísseis S-300 terra-ar a Damasco. A decisão foi anunciada pelo chefe de estado-maior adjunto das forças armadas russas, Sergei Rudskoi, e representaria um reforço considerável das capacidades de defesa antiaérea síria.
Desde o início do conflito em 2011, Israel já realizou mais de uma centenas de ataques em território sírio contra bases onde se encontram forças iranianas assim como tem atacado comboios de veículos do Hezbollah libanês. E estaria pronta para atacar o próprio Irão. Numa entrevista ao The Jerusalem Post, o brigadeiro-general (na reserva) Amir Nachumi afirmava ontem que "se a decisão for tomada ao nível político, temos pilotos e aviões para o fazermos". Israel começou a receber em dezembro caças furtivos F-35, a mais recente geração de aviões de combate americanos.