"Presos políticos" levam de novo os catalães para as ruas
Depois das divisões entre independentistas causadas pela decisão do presidente da Generalitat, Carles Puigdemont, de suspender a declaração de independência, a detenção de dois líderes da sociedade civil funcionou como um rastilho para o regresso aos protestos. Milhares de catalães saíram ontem às ruas para, à luz de velas, pedir a libertação do presidente da Assembleia Nacional Catalã (ANC), Jordi Sànchez, e o da Òmnium Cultural, Jordi Cuixart. Para o governo catalão ambos são "presos políticos em pleno século XXI". Uma designação que Madrid recusa: "Em Espanha, ninguém está preso por pensar de uma forma ou de outra, mas por não cumprir a lei", disse o ministro do Interior, Juan Ignacio Zoido.
Sànchez e Cuixart foram detidos segunda-feira à noite por decisão da juíza da Audiência Nacional Carmen Lamela, que os investiga por sedição (pena até dez anos de prisão). Nos protestos de 20 de setembro, manifestantes cercaram durante horas os agentes da Guardia Civil que efetuavam buscas na Secretaria de Economia da Generalitat, por causa da organização do referendo de 1 de outubro. Lamela considerou que ambos foram promotores do protesto, nunca usando o controlo que tinham sobre as pessoas para pedir a desmobilização.
Contudo, vídeos divulgados nas redes sociais mostram Cuixart a pedir isso mesmo por volta das 23.00, obtendo uma negativa por parte da multidão. Depois, segundo testemunhas, Sànchez fez o mesmo, também sem sucesso. Outros dos acusados, o major dos Mossos d"Esquadra, Josep Lluís Trapero, saiu em liberdade, mas está proibido de deixar o país. Ontem, foi recebido em aplausos no regresso ao trabalho.
"Por mais que detenham o presidente, haverá sempre gente que assumirá o controlo porque somos milhares de sócios mobilizados", disse o porta-voz da ANC, Agustí Alcoberro, numa conferência de imprensa. "A detenção de Sànchez e de Cuixart obriga-nos a passar para uma nova escala de mobilizações, que serão sempre pacíficas porque não sabemos fazê-lo de outra forma", indicou por seu lado o porta-voz da Òmnium Cultural, Marcel Mauri, convocando para sábado uma grande manifestação em Barcelona, às 17.00 (16.00 em Lisboa).
A nível político, o governo catalão reuniu-se ontem para avaliar que resposta dar ao primeiro-ministro espanhol, Mariano Rajoy, após a negativa à nova proposta de diálogo. O porta-voz e conselheiro da presidência, Jordi Turull, explicou que Puigdemont não vai recuar até ao fim do prazo do ultimato, amanhã. E reiterou que o governo atua com base no mandato dos catalães, expresso a 1 de outubro. Ontem, os juízes do Tribunal Constitucional (que haviam suspenso o referendo) consideraram definitivamente inconstitucional a lei que permitiu a sua convocação.
"Oferecemos diálogo e recebemos repressão. Não pedimos que o Estado renuncie a nada, só pedimos para nos sentarmos e negociar, e não nos responderam", disse Turull. "A rendição não faz parte de nenhum dos cenários deste governo. A partir de quinta veremos em que terreno se quer situar o Estado [euroespanhol]", acrescentou. A Candidatura de Unidade Popular (CUP), cujos dez deputados garantem a maioria independentista no Parlamento da Catalunha, avisou ontem que dentro de "dias" vai proclamar a "república catalã" e iniciar o processo constituinte.
Se ninguém recuar, o próximo passo é o acionar do artigo 155.º da Constituição espanhola, nunca antes usado, que depende de uma autorização do Senado (onde o Partido Popular tem a maioria e além disso conta com o apoio do PSOE neste caso). Para o governo catalão o recurso a este mecanismo implica a suspensão da autonomia, enquanto o executivo espanhol lembra que é uma forma de a Catalunha voltar à legalidade. O primeiro-ministro espanhol irá ao Conselho Europeu, na quinta e na sexta-feira, devendo apresentar a sua proposta ao Senado no plenário da próxima semana, a partir de terça-feira.