Presidente do Kosovo demite-se para responder por crimes contra a humanidade
Hashim Thaçi disse que irá entregar-se voluntariamente em Haia para defender a sua inocência.
O presidente do Kosovo, Hashim Thaçi, líder guerrilheiro durante a guerra pela independência da Sérvia nos anos 1990, demitiu-se hoesta quinta-feira para enfrentar acusações de crimes de guerra e contra a humanidade num tribunal especial em Haia.
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Ex-dirigente do Exército de Libertação do Kosovo (UÇK, os separatistas armados albaneses), Thaçi anunciou a sua renúncia ao cargo numa conferência de imprensa realizada hoje em Pristina, capital de Kosovo.
"Não vou comparecer em tribunal como presidente e, [por isso] renuncio hoje para proteger a integridade do Estado", disse Thaçi aos jornalistas.
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Segundo adiantou, irá a Haia, sede do Tribunal Especial para o Kosovo, para se entregar voluntariamente e defender a sua inocência.
Thaçi foi indiciado pelo tribunal criado para julgar alegados crimes de ex-líderes rebeldes de etnia albanesa.
O tribunal sobre o Kosovo teve origem num inquérito internacional que decorreu após um relatório do Conselho da Europa que questionou as atividades de antigos comandantes UÇK, incluindo Hashim Thaçi.
O ex-primeiro-ministro kosovar Ramush Haradinaj demitiu-se em julho de 2019, após ser convocado pelo tribunal especial na qualidade de suspeito.
Kadri Veseli, ex-dirigente dos serviços de informações do UÇK e presidente do parlamento cessante, anunciou em novembro passado ter também recebido uma convocatória do tribunal.
Um relatório do Conselho da Europa evocou a morte ou desaparecimento de 500 pessoas, incluindo 400 sérvios, após a retirada das forças sérvias em junho de 1999, e quando o UÇK garantia o controlo "quase exclusivo" da situação no terreno.
O relatório refere-se designadamente a execuções sumárias, sequestros e tráfico de órgãos retirados das vítimas.
Os detalhes exatos do processo contra Thaçi, Haradinaj e Veseli não foram divulgados, mas, ao anunciar a existência da acusação, a procuradoria especial alegou que os acusados foram "criminalmente responsáveis por quase 100 assassínios".
Na altura, a procuradoria adiantou ter tornado pública a existência da acusação devido àquilo que chamou de "repetidos esforços de Thaçi e Veseli para obstruir e minar" o trabalho do tribunal e afirmou que ambos tentaram anular a lei de Kosovo que criou o tribunal.
O Kosovo, com cerca de 1,8 milhões de habitantes e ex-província sérvia com larga maioria de população albanesa, autoproclamou a independência em 17 de fevereiro de 2008, reconhecida de imediato pelos Estados Unidos e Reino Unido e, progressivamente, por 22 dos 27 Estados-membros da UE.
Espanha, Roménia, Grécia, Eslováquia e Chipre são os países da UE que não legitimaram a independência do Kosovo.
Para além de Belgrado, a antiga província do sul da Sérvia também não foi reconhecida pela Rússia, China, Índia, África do Sul e dezenas de outras capitais.
A intervenção do exército da Sérvia no Kosovo em 1998, para combater os pró-independentistas armados albaneses, motivou o envolvimento da NATO contra a Sérvia, e ainda no Montenegro, entre março e junho de 1999, quando foi assinado um acordo de tréguas em Kumanovo, cidade da Macedónia do Norte.
Na sequência desde acordo, o Conselho de Segurança da ONU aprovou uma resolução que confirmava a integridade territorial da Sérvia, com base na qual Belgrado recusou reconhecer a independência.