Junqueras: "Votar não é um crime, mas impedir à força que as pessoas o façam é"
O ex-presidente do governo catalão Oriol Junqueras, acusado de rebelião e peculato na organização do referendo de 1 de outubro de 2017 e consequente declaração unilateral de independência, defendeu esta quinta-feira em tribunal a sua inocência, lembrando que "votar não é um crime, mas impedir à força que as pessoas o façam é", referindo-se à atuação policial no dia da consulta popular ilegal.
"Fechar os locais eleitorais, com a violência que se fecharam, não era para impedir as pessoas de votar, porque podiam fazê-lo em qualquer local", disse Junqueras, que conta como ele próprio não votou no seu local habitual, porque tinha sido fechado pela polícia, mas votou noutro local. A violência, refere, era para "gerar um ambiente de crispação". O ex-vice-presidente fala também das agressões policiais, lembrando que as imagens foram vistas em todo o mundo. "Houve uma violência injustificada", afirmou.
A procuradoria pede uma pena de 25 anos de prisão pelos crimes de rebelião, agravado pela sua condição de líder e promotor, e por desvio de fundos públicos. Dos 12 arguidos, é aquele sob o qual pesa uma pena de prisão mais elevada, sendo o primeiro a declarar no julgamento que começou esta quarta-feira no Supremo Tribunal, em Madrid.
"Nada do que fizemos é crime. Votar num referendo não é crime, trabalhar de maneira pacífica não é crime. Dos crimes que nos atribuem, não fizemos nem um", afirmou Junqueras, reiterando que é acusado pelas suas "ideias" e não pelos seus "factos" e que se considera "um preso político". Noutro momento, reitera que não é crime defender a independência da Catalunha. "Como pode ser um crime trabalhar pacificamente por uma opção política?"
Nas respostas às questões do seu advogado, Andreu Van den Eynde, Junqueras pede desculpa por deixar transparecer "um pouco de paixão" na sua intervenção. "Há um ano que não me deixam falar", refere o ex-vice-presidente catalão, que foi detido em novembro de 2017.
Junqueras explicou que as manifestações independentistas tiveram sempre "caráter pacífico" e que todo o processo decorreu de forma "pública", "cumprindo o mandato democrático" que os independentistas tinham.
Em resposta à questão de como surgiu a ideia de fazer o referendo, Junqueras diz que "houve um debate orçamental que acabou como o de ontem, com o orçamento chumbado. E fruto desta perda de votação havia uma possibilidade que era convocar uma moção de confiança que foi acompanhada por uma proposta de referendo. A proposta teve apoio amplo." E diz ainda que "a independência da Catalunha é legítima".
Em relação ao financiamento do referendo, Junqueras disse que não houve qualquer custo para os contribuintes. E lembra que o Ministério das Finanças espanhol tinha os gastos na Catalunha controlados e que o próprio ex-ministro Cristóbal Montoro negou que tivesse havido dinheiro público no referendo.
Sobre o resultado do referendo, Junqueras explicou que foi "esmagador" a favor da independência e que o governo catalão o que fez "foi mantermos a nossa vontade de diálogo com o governo espanhol". Indicou ainda que sempre defendeu a multilateralidade. "Esta é uma questão que tem que ser resolvida desde as instituições catalãs, espanholas, europeias e institucionais", acrescentou, defendendo uma "solução política".
Junqueras também negou conhecer o chamado "Enfocats", um documento encontrado durante as buscas que contem o alegado plano dos independentistas para alcançar o seu objetivo. "Nunca o tinha visto, nem nunca tinha ouvido falar dele", disse o ex-vice-presidente. Esta é uma das provas da acusação contra os independentistas.
Na primeira parte da sessão, Junqueras lembrou ainda que "ama Espanha" e sempre o disse: "Eu disse em muitas ocasiões que amo Espanha e amo as pessoas de Espanha e a língua e a cultura espanholas. Porque é verdade. Como é que isso é compatível com o facto de ser um republicano catalão? Porque estou convencido que o melhor modo de garantir esta convivência e essas relações é um reconhecimento entre iguais."
Uma declaração que suscitou uma resposta do líder do Ciudadanos, Albert Rivera, no Twitter: "'Amo Espanha', diz o golpista Junqueras. Aqueles que amamos Espanha não tentamos liquidar Espanha nem dar golpes de Estado contra a nossa democracia, nem dizemos que os catalães têm genes diferentes ao resto dos espanhóis, como você faz. Cinismo puro."