O que acontece no dia 14? (no Parlamento britânico)

Quinta-feira, dia 14, é Dia de São Valentim. Mas no Reino Unido é mais do que isso. É o dia em que os deputados britânicos vão novamente mergulhar num debate interminável sobre o Brexit, trocando acusações políticas entre si, discutindo sobre as negociações (inexistentes) com a UE27, sobre uma nova votação - e possíveis emendas - ao um novo acordo, um Plano B (que não existe)
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Theresa May volta esta terça-feira à câmara dos Comuns para falar do Brexit. Não para apresentar uma nova proposta de acordo. Apenas para fazer uma atualização. A primeira-ministra britânica deverá pedir de novo apoio ao acordo que já foi chumbado. Por causa do backstop. Sob promessa de tentar renegociar ainda com a UE27 o mecanismo de salvaguarda que regula a situação na fronteira entre a Irlanda do Norte e a República da Irlanda depois de o Reino Unido sair da União Europeia. Como decidiu no referendo de 2016. Por 52% de votos a favor do Brexit e 48% contra.

A comparência da chefe do governo britânico, do Partido Conservador, estava inicialmente prevista para quarta-feira, mas foi antecipada porque May quer dar aos deputados tempo de prepararem eventuais moções ou emendas para submeter a votação. Na quinta-feira. Apesar de ser Dia de São Valentim, aquilo que a líder britânica tem para transmitir aos deputados não propriamente cartas de amor vindas de Bruxelas. Aliás, a forma como o tom tem subido nos últimos tempos, mostra, precisamente, o contrário. Ressentimento. Tensão. E até algum pânico.

"Tenho estado a pensar se há um lugar especial no inferno para aqueles que promoveram o Brexit sem ter um plano para o executar de forma segura", declarou, na semana passada, o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, causando polémica. Deitando mais uma acha para a fogueira, o chefe das negociações para o Brexit do Parlamento Europeu, Guy Verhofstadt, acrescentou: "Bem, duvido que Lucifer os quisesse lá, depois do que fizeram aos britânicos, até o inferno iriam conseguir dividir", escreveu, no Twitter, o eurodeputado liberal e líder do grupo ALDE.

Eis o que pode acontecer no debate sobre o Brexit no Dia de São Valentim;

O que é que os deputados vão debater na câmara dos Comuns?
Depois de May fazer a sua atualização aos deputados sobre o acordo do Brexit, o debate de quinta-feira na câmara dos Comuns será sobre uma moção, a apresentar, sobre a saída do Reino Unido da UE. O último debate do género aconteceu a 29 de janeiro, depois de os deputados terem chumbado, no dia 15 desse mês, o acordo do Brexit fechado em novembro entre Londres e a UE27. Nessa altura, os deputados aprovaram duas das moções que foram aceites a votação pelo speaker do Parlamento britânico John Bercow: uma a rejeitar um No Deal Brexit (embora sem força jurídica), outra a mandatar May para renegociar com Bruxelas o acordo procurando soluções alternativas ao ponto do backstop. Problema: os líderes das instituições e dos países da UE continuam a dizer que nada há para renegociar.

Os deputados podem propor alterações?
Sim. Tal como aconteceu aquando do debate e votação de 29 de janeiro. A moção ou moções que forem aprovadas poderão voltar a reorientar as negociações (que de facto não existem) no sentido de bloquear, atrasar ou renegociar a saída do Reino Unido da UE. Com a UE27 a dizer que nada há a renegociar, alguns deputados poderão tentar condicionar a primeira-ministra, obrigando-a a ir por outros caminhos, como por exemplo procurar laços mais estreitos com a UE (possivelmente uma união aduaneira como quer o líder do Labour Jeremy Corbyn) ou realizar um segundo referendo sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia.

A primeira-ministra britânica divergiu da proposta do líder da oposição para negociar uma união aduaneira com a União Europeia, mas sugeriu, numa carta endereçada a Jeremy Corbyn, mais discussões para tentar desbloquear o processo do Brexit.

Respondendo à carta que Corbyn enviou na semana passada, na sequência de um encontro pessoal entre os dois, May voltou a enfatizar que a Declaração Política que acompanha o Acordo de Saída do Reino Unido da UE negociado com Bruxelas "oferece explicitamente as vantagens de uma união aduaneira - sem tarifas, taxas, encargos ou restrições significativas".

A chefe do governo questionou, assim, a proposta de Corbyn para "união aduaneira permanente e abrangente" que inclua poder de decisão do Reino Unido sobre os futuros acordos comerciais da UE, pois tal impediria o país de negociar os próprios acordos com países terceiros.

A 29 de janeiro, a emenda dos deputados Yvette Cooper (Labour) e Nick Boles (Partido Conservador), no sentido de dar ao Parlamento poderes para atrasar a data do Brexit, previsto para 29 de março, foi derrotada. Mas Boles, pelo menos, já disse que pretende voltar a submeter a debate e a votação a mesma emenda. Os deputados recusaram esta emenda, dando a May a oportunidade de demonstrar que a UE estava aberta a procurar soluções alternativas ao backstop. Porém, tal não aconteceu. Assim sendo, a emenda pode ser repescada.

Haverá novas votações?
Mais uma vez a decisão cabe ao speaker da câmara dos Comuns John Bercow. Cabe a ele decidir quais das moções apresentadas vão efetivamente a votos ou não. Antes de o debate começar, os deputados deverão decidir igualmente a sua duração. Ou seja: o debate poderá durar apenas um dia ou arrastar-se durante mais tempo, até à próxima semana.

O que acontece depois disto tudo?
Os próximos passos no que ao Brexit diz respeito vão depender muito do que acontecer quinta-feira no Parlamento britânico: se isso vai ou não alterar o curso da discussão ou se os deputados vão apoiar a estratégia de May (que muitos não vislumbram qual é). É provável que os deputados deem a May e ao seu governo mais tempo para negociar, o que quer dizer que, na prática, tudo pode ficar na mesma.

O impacto das emendas, a serem aprovadas, dependerá também da forma como forem formuladas, o que só se saberá após a atualização que a primeira-ministra vai fazer esta terça-feira.

O governo de May prometeu que, em última análise, se não se chegar a um novo acordo (neste momento inexistente) o Parlamento terá oportunidade de voltar a debater o tema a 27 de fevereiro, usando este mesmo formato. Nessa altura, faltará um mês para a data oficial do Brexit.

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