O estranho caso do ex-general venezuelano preso pelos EUA
Clíver Alcalá apresentou-se na sexta-feira a agentes dos serviços secretos colombianos que depois o entregaram às autoridades americanas, informou o jornal El Tiempo de Bogotá. A acusação e detenção do ex-militar dá-se no contexto de uma alegada operação falhada de Alcalá para a oposição venezuelana com a colaboração dos EUA.
O ex-militar, que viveu na cidade de Barranquilla (norte da Colômbia) durante dois anos, foi levado para Nova Iorque num voo com permissão especial dado o confinamento geral decretado na Colômbia pela pandemia do novo coronavírus, informou o jornal. "Não vou fugir, não tenho motivos para fugir. Em minha defesa o meu trabalho era para o povo venezuelano", reagiu nas redes sociais quando foi acusado pelos EUA de narcotráfico.
Alcalá colaborou com o antigo presidente Hugo Chávez no falhado golpe de Estado de fevereiro de 1992, tendo mais tarde ocupado vários cargos militares na Venezuela. Crítico do regime de Nicolás Maduro, radicou-se na Colômbia em 2018.
Acusado pela oposição de ser um "agente duplo" (da oposição e do regime), disse estar a ser vítima de uma campanha de descrédito promovida pelo governo venezuelano.
Nas redes sociais, e antes de se ter entregado às autoridades, Alcalá descreveu a acusação feita pelo governo dos EUA como "uma situação extremamente desconfortável". Não é de descartar que em troca de um testemunho contra Maduro e os seus próximos, o antigo militar obtenha um acordo favorável com a justiça norte-americana.
Questionados pela AFP, a polícia e o governo colombianos e a embaixada dos Estados Unidos em Bogotá não forneceram informações sobre a entrega. Também as entidades norte-americanas recusaram-se comentar o caso neste sábado.
O Ministério Público da Venezuela anunciou sexta-feira que pediu à Colômbia que procedesse à sua detenção e extradição, um dia depois de o procurador-geral venezuelano, Tarek William Saab, abrir uma investigação contra Alcalá e contra o líder da oposição, Juan Guaidó, por alegadamente estarem a preparar um golpe de Estado contra Nicolás Maduro.
Entre as provas divulgadas pelo procurador-geral venezuelano está uma notícia da rádio colombiana WRádio, na qual o antigo militar afirmou que um carregamento de armas confiscado pelas autoridades da Colômbia tinha como propósito uma operação contra o presidente da Venezuela.
Cliver Alcalá alegou ter sido contratado por Juan Guaidó e assessores norte-americanos para comprar armas para uma intervenção que afastaria Nicolás Maduro do poder.
"As armas apreendidas na Colômbia pertenciam ao povo venezuelano, no marco de um pacto ou acordo assinado pelo presidente Guaidó, o sr. JJ Rendón, o sr. (Sergio) Vergara e assessores norte-americanos", disse Alcalá, referindo-se à operação colombiana que na terça-feira confiscou 26 espingardas de assalto AR-15 e equipamento militar na estrada entre as cidades de Barranquilla e Santa Marta.
"Há muitos meses estamos a trabalhar na formação de uma unidade para a liberdade da Venezuela." No entanto, acusou um parte da oposição de colaborar com Maduro. "Tínhamos tudo pronto, mas as circunstâncias que foram geradas na luta contra o regime geraram infiltrações no seio da oposição, aquela oposição que quer continuar a conviver com o governo Maduro, aquela oposição que não quer que nada mude na Venezuela, pois na Venezuela os vícios são substituídos, mas os vícios não são eliminados."
Caracas acusa a Colômbia de ter oferecido o seu território e apoiado a conspiração, apesar de que o ex-militar afirma que as autoridades colombianas não tinham conhecimento da operação.
O Departamento de Justiça dos Estados Unidos acusou, quinta-feira, o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, e 13 pessoas do seu círculo de narcoterrorismo, anunciou a administração norte-americana.
Segundo o Departamento de Justiça, são acusados de conspirar com rebeldes colombianos para "inundar os Estados Unidos de cocaína".
Os EUA anunciaram recompensas de milhões de dólares para quem dê informações que levem à detenção de Nicolás Maduro, do presidente da Assembleia Constituinte, Diosdado Cabello, do presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Maikel Moreno, do ministro da Defesa, Vladimir Padrino López, do ex-vice-presidente da Venezuela, Tareck El Aissami, entre outros.