Rapper Emicida: Michel Temer é "a bigorna que atrasa" o país

O Presidente não eleito do Brasil, Michel Temer, é "a bigorna que atrasa o país", mas, como não tem "caráter" para deixar o poder "voluntariamente", a população tem que fazer "pressão", realça o rapper brasileiro Emicida.
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Em entrevista à Lusa, pouco antes do concerto no Castelo de Sines, integrado no Festival Músicas do Mundo, Emicida disse que "o Brasil passa por um momento frustrante, deprimente", com "uma verdadeira quadrilha que se apossou do poder".

Essa situação "tira o chão, tira todas as expectativas das pessoas, no sentido da melhora", observa, frisando que a força da rua -- para onde têm desembocado muitos brasileiros, em protesto diário -- não é suficiente para combater o poder económico, que "manda nos meios de comunicação", que moldam "a opinião da população, que tem uma informação distorcida, até a respeito de si mesma".

No último ano, o Brasil viveu uma crise política sem precedentes, com o ex-presidente Lula da Silva condenado, a ex-presidente Dilma Rousseff destituída e, ameaçado por um processo de corrupção, Michel Temer, o atual presidente, que chegou ao poder em 2016, sem eleições, após a destituição de Dilma Rousseff, de quem era vice-presidente.

"Torço para que haja um despertar da população, para que ela se posicione em relação a todos esses desmandos que têm acontecido", realça Emicida.

Uns minutos depois de começar o concerto, Emicida interrompeu para partilhar com o público como era "mágico" estar ali, ele, e os restantes músicos da banda, que nasceram e cresceram "num barraco", com "uma história foda de sofrimento e de vitória". Por isso mesmo, não podia deixar de criticar "uma atitude" de um segurança, à entrada no castelo, que o revistou insinuando que estaria armado.

Era altura de situar quem o ia ver e ouvir: se, para quem tem "pele clara", a conversa do racismo é "desagradável", porque "enche o saco" e "já foi", para quem vive com a pela mais escura, todos os dias, a dimensão é outra, porque "não consegue ir trabalhar um dia sem ser confundido com um criminoso".

"Ansiosão" para ouvir as músicas que vão passar por um festival que "contempla coisas de vários lugares do planeta", num "lugar bonito p'ra caramba", Emicida falou do projeto musical Língua Franca -- que partilha com os rappers portugueses Capicua e Valete e o brasileiro Rael -- como "uma maneira de grudar duas formas contemporâneas de se falar o português", que junta "duas visões do mundo, com o Atlântico no meio".

O que ele gosta no português de Portugal é a ortodoxia de "santificar a sílaba tónica". No Brasil, "o português é vivo, semana que vem é outro idioma", compara.

"O hip hop é uma cultura global, é o que a globalização devia ser, uma troca constante de riquezas, culturais, artísticas, poéticas, sem distinção das linhas que separam os países", descreve.

Essa postura não é necessariamente política. "Não tem obrigação nenhuma. Aliás, ninguém é obrigado a nada. (...) O meu hip hop é livre, eu luto pela liberdade. As pessoas é que compreendem que, quando se fala de liberdade, isso é um ato político, porque as pessoas se sentem presas", reflete.

Claro que, sem querer "obrigar ninguém a se posicionar", quando as pessoas "não conseguem conter o ímpeto" de o fazer, "isso é muito nobre", reconhece. Mas ninguém deve ser obrigado, senão "vira uma outra coisa, que é tudo menos liberdade", frisa.

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