Memoriais do Holocausto enfrentam provocações da extrema-direita
Suásticas pulverizadas nas paredes, selfies de saudações a imitar Hitler, mensagem de negação no livro de visitas e visitantes e a duvidar dos guias turísticos são cada vez mais recorrentes em museus alemães
De suásticas pulverizadas nas paredes a selfies de saudações a imitar Hitler, as provocações de extrema-direita são um problema crescentes nos locais dos antigos campos de concentração nazi na Alemanha.
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Os diretores do museu alertaram para um aumento do número de incidentes, que incluem visitantes a escrever mensagens de negação do Holocausto no livro de visitas e a duvidar dos fatos do genocídio contados pelos guias turísticos.
"Mensagens glorificando o nazismo ou exigindo a reabertura dos campos de concentração para estrangeiros tornaram-se mais comuns", disse à AFP Volkhard Knigge, diretor do museu do antigo campo de concentração de Buchenwald, no leste da Alemanha.
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"Sempre houve incidentes em memoriais, mas temos notado uma escalada recente devido à violação dos tabus linguísticos por parte da extrema-direita", acrescentou.
Em Buchenwald, onde 56.000 pessoas morreram entre 1937 e 1945, o número de incidentes relatados duplicou desde 2015.
Os extremistas de direita também são conhecidos por tirar selfies sorridentes em frente a fornos usados para cremar vítimas e deixar adesivos que glorificam o nazismo, disse Knigge.
Mais recentemente, um número crescente de guias turísticos têm sido interrompidos por extremistas que propagavam teorias revisionistas.
Uwe Neumaerker, diretor do Memorial de Berlim aos Judeus Mortos da Europa, disse que o seu museu enfrentava problemas semelhantes. "Os visitantes estão a questionar a veracidade do genocídio. Isso é algo que nunca vivenciámos."
Este ano assinala.-se 75 anos desde a libertação da maioria dos campos de extermínio nazis na Europa.
O aumento de incidentes em memoriais também ocorre quando a geração de alemães que viveram a Segunda Guerra Mundial está a começar a desaparecer e a atenção está a mudar para garantir que os horrores do Holocausto, nos quais seis milhões de judeus foram sistematicamente assassinados, não sejam esquecidos.
Mas, nos últimos anos, o partido anti-imigrante AfD estabeleceu-se como o movimento de extrema-direita de maior sucesso eleitoral na história do pós-guerra da Alemanha. Fundado em 2013, o AfD é agora o maior partido da oposição no parlamento alemão, e muitas das suas figuras-chave atacaram a antiga cultura de expiação por crimes nazis.
O líder regional Bjoern Hoecke pediu uma "reversão de 180 graus" na cultura da memória alemã e classificou o memorial do Holocausto de Berlim como "monumento da vergonha".
"A extrema-direita e o AfD sempre adotaram uma estratégia de forçar a normalização dos seus pensamentos", disse Bianca Klose, da organização de anti-extrema-direita. Desde que o partido conquistou cadeiras em todos os parlamentos regionais da Alemanha, vários parlamentares do AfD também tentaram influenciar os programas histórico-culturais dos memoriais, acrescentou.
"Eles questionam as escolhas pedagógicas e tentam apagar certos aspetos históricos. Pior ainda, intimidam as pessoas, exigindo informações sobre a vida privada ou a orientação política delas", disse Klose à AFP.
Existem 15 antigos campos de concentração em solo alemão que foram transformados em memoriais. Os mais conhecidos entre eles, Dachau, Sachsenhausen, Neuengamme, Bergen-Belsen, Ravensbrueck e Buchenwald, receberam quase três milhões de visitantes em 2018.
Mas, diante do novo desafio da extrema-direita, muitos sites foram forçados a se adaptar.
Em Berlim, Neumaerker permite que os seus guias escolham se aceitam ou não grupos do AfD e forneceu aos funcionários treino especial sobre como reagir a provocações. Como o seu colega Knigge em Buchenwald, colocou na lista negra certos membros do AfD.
Em Neuengamme, todas as delegações do AfD são acompanhadas por guias turísticos extras. Alguns locais também introduziram a chamada "cláusula extremista", proibindo o acesso a qualquer pessoa que use roupas que façam referência ao Terceiro Reich.
No entanto, o financiamento de câmaras de vigilância e pessoal de segurança desvia fundos que "seriam mais úteis na educação, especialmente para os mais jovens", afirmou Knigge.
O diretor de Buchenwald também disse que lamentava que as escolas reduzissem as lições dedicadas exclusivamente ao ensino da história do nazismo durante o horário escolar, uma questão que provocou preocupação na Alemanha. "Os memoriais não podem compensar o que as escolas não estão a fazer", rematou.